quinta-feira, 30 de abril de 2015

Truculência e covardia: polícia tucana desce o cacete nos professores

Meme da internet - autor desconhecido



Paraná em chamas - O massacre que Curitiba assistiu em 29 de abril

Dimitri do Valle - especial para #JornalistasLivres

A série de explosões começou a ser ouvida pouco antes das três da tarde. Quem estava a distâncias que chegavam a seis quilômetros, por exemplo, conseguia ter uma ideia clara de que as coisas no Centro Cívico, a praça dos três poderes do Paraná (mais a Prefeitura de Curitiba), não estavam para brincadeira. Os estrondos eram resultado da ação violenta de policiais militares contra servidores públicos, a maioria professores da rede estadual.

Há dois dias, eles protestavam contra uma série de medidas de arrocho que a Assembleia Legislativa começava a colocar em segunda e última votação naquele momento. No final da tarde, sabia-se que houve pelo menos 107 feridos — dois policiais e 105 servidores. O placar medonho retrata um verdadeiro massacre.

Já à noite, sabia-se que os feridos, aumentaram para 150, segundo informações oficiais do SAMU. Oito deles seguiam em estado grave por causa de mordidas de cães policiais e tiros com balas de borracha.

Na segunda-feira, com o registro de escaramuças entre PMs e servidores, mas em escala menor do que a de hoje, o fatídico e já histórico 29 de abril, os deputados já haviam aprovado em primeira votação, por 31 votos favoráveis contra 21 o tal pacotaço, encaminhado pelo governador Beto Richa (PSDB) para melhorar as finanças do Estado, cujos balanços festejados por ele mesmo durante sua campanha à reeleição, no ano passado, apontavam para uma contabilidade em céu de brigadeiro.

Por mais de uma hora e meia, as bombas de gás e de efeito moral mostraram do lado de fora do parlamento estadual que eram a verdadeira garantia para a votação definitiva de hoje no interior do prédio, fazendo valer a vontade de Richa e de sua equipe de governo, comandada pelo baiano Mauro Ricardo Costa, importado pelo tucano para seu segundo mandato e já conhecido pelos serviços prestados na área fazendária da Prefeitura de de Salvador (BA), gestão de ACM Neto (DEM), e no governo de São Paulo, na gestão de José Serra (PSDB). A sessão prosseguia, sem final previsto, até a conclusão desta reportagem.
No entanto, à medida em que as bombas, os cães, as balas de borracha e os cassetetes caíam sobre os manifestantes armados apenas com gritos e palavras de ordem, deputados preocupados com a onda de violência que se desenrolava na praça principal, em frente a Assembleia, batizada de Nossa Senhora da Salete (trágica ironia), chegaram a sair do prédio para pedir calma aos policiais.
A exemplo de servidores públicos feridos, com quem ficou lado a lado durante a confusão e barbárie generalizada na praça, o deputado Rasca Rodrigues, do PV, saiu no prejuízo e foi mordido por um dos cães da tropa de choque da PM, além de ter aspirado gás de pimenta e lacrimogênio. Voltou ao prédio com sangue escorrendo pelo braço.
Proibidos de se aproximar da Assembleia Legislativa por grades e um cordão humano de 1.500 policiais, a maioria deslocados de batalhões do interior e sem garantia de pagamento de suas diárias, restou aos manifestantes fazer o caminho de volta, diante da intensa repressão policial que se iniciou. Eles voltavam correndo em direção à avenida Cândido de Abreu, a principal via de ligação com o Centro Cívico. Não estavam sozinhos.
O prédio mais próximo em que eles poderiam ficar à espera de socorro, foi a Prefeitura, comandada atualmente por Gustavo Fruet (PDT), atual desafeto de Richa, que lhe negou candidatura a prefeito, em 2012 pelo PSDB, vindo a se candidatar e ganhar o poder da capital, como azarão.
O hall de entrada e salas próximas, onde o IPTU e tributos municipais são cobrados, foram transformados em hospital de campanha. Vídeos de smartphones com os feridos deitados, sangrando e sem camisa passaram a ser veiculados na internet. Mesas de trabalho viraram maca, e as poucas que chegavam, apareciam por meio das escassas equipes do SAMU, que estavam em dificuldades para se aproximar do Centro Cívico, por conta do bloqueio policial de ruas próximas, e à multidão em fuga por calçadas e a avenida principal.
O expediente em toda a Prefeitura foi interrompido para que se desse cabo do atendimento aos feridos. Só ali foram acolhidos 35, muitos deles machucados no corpo, da cabeça aos pés, pelas balas de borracha das carabinas da tropa de choque e outros com dificuldade de respiração por inalação dos gases de dispersão, além dos atingidos de praxe pela força dos cassetetes. Testemunhas entre os manifestantes relataram ter visto um helicóptero com policiais atirando bombas em voos rasantes, no que seria o primeiro ataque aéreo feito contra seus próprios civis em território nacional.
Uma creche municipal que fica no Centro Cívico, a poucas quadras da praça onde a guerra prosseguia, testemunhou de dentro de suas paredes todo o terror protagonizado pelos policiais. Se a seis quilômetros, o barulho das bombas se fazia surpreender, como exposto no início deste relato, pode-se ter uma ideia da intensidade dos estrondos e do eco provocado dentro da creche infantil, exposta ao barulho das explosões e dos gritos dos manifestantes, apoiados por potentes carros de som, além do incômodo nauseante da fumaça dos gases de dispersão.
O choro tomou conta das crianças, funcionários e professores, que não tinham a quem recorrer, restando torcer para que tudo terminasse o mais breve possível, o que não aconteceu.
Do ponto de vista militar, a polícia cumpriu, mesmo com o uso de força excessiva, a missão de deixar afastados da Assembleia os manifestantes, o que não havia conseguido em fevereiro, quando Richa tentou colocar o pacotaço em votação pela primeira vez, ocasião em que foi rechaçado pela presença de 20 mil manifestantes e um mês de greve dos professores, a maior categoria de servidores do Estado, com 50 mil profissionais.
Naquela ocasião, os deputados da bancada governista tiveram que entrar na Assembleia dentro de um vetusto e gigante camburão policial de cor preta. Tentaram encaminhar a votação do restaurante da assembleia, pois o plenário havia sido ocupado, mas tiveram medo da reação dos manifestantes e adiaram o intento.
Como se percebe, era questão de tempo para Richa assimilar o recuo, reorganizar a tropa, tanto a da fiel Assembleia, como a das balas, bombas e porretes, para fazer valer seu projeto que tira vários direitos do funcionalismo, como o corte de licenças de parte dos professores, o livre uso de recursos dos fundos estaduais, inclusive o do poder Judiciário, aumento da alíquota do ICMS de mais de 90 mil produtos, e mudanças no setor de previdência dos servidores, que os obrigarão a pagar um índice extra caso queiram manter seus salários integrais acima de R$ 4,6 mil.
Antes que o leitor estranhe esse direcionamento nessa parte do texto, um pouco de história recente da política local. Em 30 de agosto de 1988, a PM reprimiu no mesmo Centro Cívico, um protesto de professores da rede estadual, no então governo de Álvaro Dias, na época no PMDB, e hoje senador filiado ao PSDB. Muitos decretaram o fim de sua carreira política, marcado pelo pisoteio da cavalaria em professores desarmados, mas Álvaro segue firme na lida. Tirando duas derrotas circunstanciais ao governo paranaense, contra Jaime Lerner, em 1994, a novidade política daquele ano, e Roberto Requião, em 2002, apoiado por nada menos do que o presidente Lula, o bamba da vez, Dias é o senador com mais mandatos eleitos. Ganhou, por exemplo, com ampla folga mais oito anos em 2014. Já havia sido eleito em 2006 e em 1998, portanto, depois da pancadaria de 88.
Richa tem um destino mais incerto, mas nem por isso menos favorável. Richa encarna o antiesquerdismo visceral de boa parte do eleitorado paranaense atual. Com o tempo, como todo político, pode ser beneficiado pela diluição natural do episódio dantesco, assim como aconteceu com Álvaro Dias. A diferença é que, pelo tamanho do massacre e sua presença constante na internet (ferramente inexistente na época de Álvaro), Richa poderá passar o que resta do seu segundo mandato tentando explicar os “comos” e “por ques” de tanta violência contra profissionais da Educação. E mais: boa parte da população paranaense, assim como a brasileira, ainda marca sua rotina diária em frente à televisão pelo noticiário das emissoras de sinal aberto. Nesta noite, Richa pode ser beneficiado ou não pelos filtros editoriais e critérios supostamente jornalísticos (“não abusar das imagens, tem muita criança assistindo neste momento”, pode ser um deles, sim) lançados à mão por editores e cúpulas das emissoras.
A administração de Richa enfrenta também profunda investigação sobre supostos pagamentos de propina a servidores da Receita Estadual de Londrina, no Norte do Paraná, sua cidade natal, por empresas pressionadas a se verem livres de qualquer fiscalização e cobrança dos agentes do fisco. Um dos jornalistas mais premiados do Brasil, ao investigar o caso, teve que sair da cidade, pois recebeu a informação que seria morto em falso assalto a uma churrascaria que frequentava.
O primo de Richa, Luiz Abi, é suspeito de estar por trás de fraudes de licitação para consertos de carros do governo, assunto que o jornalista ameaçado, James Alberti, da afiliada da Globo, no Paraná, também investigava em Londrina. Abi foi preso, a pedido do Ministério Público, mas atualmente responde ao processo de suspeita de corrupção em liberdade.
Beto Richa é filho de José Richa (morto em 2003). Richa pai teve papel de destaque na época da redemocratização, quando Tancredo Neves foi eleito presidente da República, no colégio eleitoral de janeiro de 1985. Se os militares da linha dura decidissem impedir a posse ou não reconhecessem o resultado da eleição indireta feita no Congresso Nacional, Richa pai havia se comprometido a participar de um plano para abrigar Tancredo no Paraná e resistir contra uma eventual tentativa de golpe, colocando a sua Polícia Militar, para proteger o novo presidente civil.
Hoje, trinta anos depois, a mesma corporação, sob o desígnio de outro Richa, faz o caminho inverso, o da violência desenfreada, sem qualquer ligação com as garantias democráticas tão defendidas pelo próprio pai, como ficou explícito na tarde desse 29 de abril, marcada pelo frio e garoa que caiu no centro do poder da Capital do Paraná.

(Via Diário do Centro do Mundo)


Onde:

https://medium.com/jornalistas-livres/paran%C3%A1-em-chamas-8650e8cece9f

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-massacre-que-curitiba-assistiu-no-29-de-abril/

sábado, 25 de abril de 2015

Na floresta encantada da linguagem (II)

Contos [visuais] contemporâneos de florestas e suas memórias # Gabriela Brioschi



"Mas a caça dialética é uma caça mágica. Na floresta encantada da Linguagem, os poetas entram expressamente para se perder, se embriagar de extravio, buscando as encruzilhadas de significação, os ecos imprevistos, os encontros estranhos; não temem os desvios, nem as surpresas, nem as trevas - mas o visitante que se afana em perseguir  a 'verdade', em seguir uma via única e contínua, onde cada elemento é o único que deve tomar para não perder a pista nem anular a distância percorrida, está exposto a não capturar, afinal, senão sua própria sombra. Gigantesca, às vezes; mas sempre sombra."

Paul Valéry, Discurso sobre a Estética (1937).



Onde:

 Textos e tribos # Antonio Risério
Ed. Imago

http://paginacultural.com.br/contos-visuais-contemporaneos-de-gabriela-brioschi/

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Mea culpa, mea maxima culpa

Pavane mille regrets # Pierre Alechinsky




MEA CULPA

por Marcelo Neto

Confesso. Votei em Lula, em 2002 e 2006, e votei em Dilma, em 2010 e 2014. 
Portanto, ao contrário do que dizem os que votaram em Aécio, tenho a ver com o que esta aí. Sou culpado.
Sou culpado de ter contribuído para tirar 36 milhões de brasileiros da pobreza extrema. Um desastre! Agora, esse pessoal que ganha essas “bolsas-preguiça” fica por aí exigindo mais direitos. Além de comida, querem educação de qualidade, querem casa, saúde, TVs de tela plana e computadores, cinema, balé e viagens. Querem tudo o que gente tem. Querem até que seus filhos façam faculdade! Essas pessoas não sabem mais qual é o seu lugar, como no passado da nossa pacífica e arcádica desigualdade. 
Sou culpado de ter incorporado 42 milhões de cidadãos à nova classe trabalhadora ou à nova classe média. Uma verdadeira hecatombe econômica e social. Hoje em dia, você entra num aeroporto qualquer e ele está atulhado. Atulhado de gente que nunca tinha voado antes. Gente que não devia estar ali. Gente que nem gente era. Está difícil achar espaços diferenciados. Shoppings, ruas antes exclusivas, bairros inteiros, e até universidades sucumbiram à barbárie do consumo popularizado. 
Mesmo fora do país a situação está difícil. Como bem observou uma grande pensadora, você vai ao exterior e pode encontrar o porteiro do seu prédio. A vida perdeu a graça. Foi-se a belle époque das gentes distintas, dos doces privilégios, do refinamento e da exclusividade. Sobrou a “rebelião das massas”. 
Também sou culpado de ter contribuído para gerar 20 milhões de empregos com carteira assinada. Resultado? Com essa taxa de desemprego baixa e o aumento de 72% do salário mínimo, mesmo em meio à maior crise mundial desde 1929, hoje é difícil achar pessoas que estejam dispostas trabalhar por alguns trocados, sem carteira assinada, como antigamente. Nossos trabalhadores, antes tão fiéis, tão resignados e disciplinados, tão baratinhos, fofinhos até, tornaram-se uma corja de achacadores que exige salários suficientes e empregos decentes. O custo Brasil foi a alturas suíças, alpinas. Eles têm o desplante de ser até contra a terceirização, essa modernidade que diminuiria nossos insuportáveis custos trabalhistas. Mesmo as empregadas domésticas, essa reconfortante recordação da escravidão, agora têm direitos insustentáveis. Mas nem tudo está perdido. Com o agravamento da crise mundial e o ajuste talvez as taxas de desemprego subam e os salários caiam. Só não vale recompor depois. Nada de retrocessos. 
E o que dizer da abertura das universidades para afrodescendentes, índios e pobres? Hoje você vai numa universidade e ela está cheia de egressos da escola pública, gente claramente pobre e de pele escura. Com o Prouni, o Reuni, a duplicação da rede federal e as absurdas cotas, as universidades estão se abrindo à população. População que não deve estar ali. 
Universidade, apesar do nome, é para poucos, não é para ser universalizada. Ainda mais com gente que não tem tradição de estudo. Sou culpado dessa degradação do ensino superior. 
Meus votos irrefletidos e irresponsáveis também contribuíram para implantar aqui esse descalabro chamado Mais Médicos. A OPAS, essa conhecida agência internacional de intermediação de trabalho escravo, com atuação em mais de 80 países, teve a audácia de, em conluio com a ONU e o governo do Brasil, trazer aqui escravos cubanos para dar assistência médica a 50 milhões de cidadãos. Ora, escravos só os brasileiros, em nossas bucólicas fazendas. Esses 50 milhões antes sobreviviam tranquilamente. Era gente forte, submetida à saudável seleção natural. Agora, contribuem para cevar uma ditadura comunista, que o Obama, em gesto insensato, resolveu reconhecer. No Brasil, contudo, a Guerra Fria tem de permanecer, gloriosa, em seu doentio anacronismo. 
E a corrupção? Antes, praticamente não havia corrupção no Brasil. Lembre-me bem que o “engavetador-geral” e a ausência de instituições independentes e fortes de controle se encarregavam disso. Não havia investigação. Portanto, não havia muitos casos de corrupção. Meu celerado voto num governo que criou as condições para que a corrupção fosse investigada a sério é que fez surgir toda essa corrupção no Brasil. Jamais me perdoarei. Mas perdoo aqueles que dizem que sonegação não é corrupção. Eles já foram redimidos por sua probidade suíça.
Tem mais. Pelo que vejo e leio em veículos isentos como Veja, Folha e Globo, entre vários outros, os meus desinformados votos levaram o país à maior crise da sua história, à exceção, pelo que recordo, de todas as anteriores, quando nos reerguíamos com as generosas mãos do FMI. 
Tenho de reagir. Não posso conviver com tamanho sentimento de culpa. Preciso ser coerente. Tenho de salvar a democracia do Brasil, com terceiro turno e intervenção militar. Devo salvar as crianças do Brasil, apoiando a redução da maioridade penal. Preciso lutar pelos empregos e pelos salários dos brasileiros, com a terceirização. Devo me empenhar pelo reerguimento da Petrobras, apoiando a venda do Pré-Sal. Será minha missão combater a corrupção, combatendo o único governo que efetivamente a combateu e a combate. 
O fato é que não dá mais para continuar mudando tanto. 
Ou se restaura o antigo Brasil, ou vou logo para Cuba expiar minhas culpas. 
De Gol. 


Onde:

http://www.wikiart.org/en/pierre-alechinsky/pavan-one-thousand-regrets-pavane-mille-regrets-from-the-portfolio-pencil-on-shell-1971

http://paulomoreiraleite.com/2015/04/20/mea-culpa/

terça-feira, 21 de abril de 2015

Liberdade, essa palavra

Tiradentes # Laerte

A liberdade é amável.

Padre Toledo (1781 - 1803) - inconfidente, nos Autos da Devassa.







Onde:

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/essencial/tiradentes-segundo-laerte/

sexta-feira, 17 de abril de 2015

A virtude da gratidão





A GRATIDÃO

A gratidão é a mais agradável das virtudes; não é, no entanto, a mais fácil. Por que seria? Há prazeres difíceis ou raros, que nem por isso são menos agradáveis. Talvez sejam até mais. No caso da gratidão, todavia, a satisfação surpreende menos que a dificuldade. Quem não prefere receber um presente que um tapa? Agradecer à perdoar? A gratidão é um segundo prazer, que prolonga um primeiro, como um eco de alegria à alegria sentida, como uma felicidade a mais para um mais de felicidade. O que há de mais simples? Prazer de receber, alegria de ser alegre: gratidão. O fato de ela ser uma virtude, porém, basta para mostrar que ela não é óbvia, que podemos carecer de gratidão e que, por conseguinte, há mérito - apesar do prazer ou, talvez, por causa dele - em senti-la. Mas por quê? A gratidão é um mistério, não pelo prazer que temos com ela, mas pelo obstáculo que com ela vencemos. É a mais agradável das virtudes, e o mais virtuoso dos prazeres.
...A gratidão se regozija com o que aconteceu, ou com o que é; ela é, portanto, o inverso do arrependimento ou da nostalgia (que sofrem com um passado que se foi, ou que não é mais), como também da esperança e da angústia, que desejam ou temem (desejam e temem) um futuro que ainda não é, que talvez nunca seja, mas que as tortura com sua ausência... Gratidão ou inquietude. A alegria do que é ou foi, contra a angústia do que poderia vir a ser. “A vida do insensato”, dizia Epicuro, “é ingrata e inquieta: ela se volta toda para o futuro” Por isso eles vivem em vão, incapazes de se saciarem, de se satisfazerem, de serem felizes: eles não vivem, dispõem-se a viver, como dizia Sêneca, esperam viver, como dizia Pascal, depois lamentam o que viveram ou, mais freqüentemente, o que não viveram... O passado como o futuro, lhes falta. Já o sábio regozija-se com viver, claro, mas também com ter vivido. A gratidão (charis) é essa alegria da memória, esse amor do passado - não o sofrimento do que não é mais, nem o pesar pelo que não foi, mas a lembrança alegre do que foi. É o tempo reencontrado, se quisermos (“A gratidão do que foi”, diz Epicuro). Compreendemos que esse tempo torna a idéia da morte indiferente, como dirá Proust, pois aquilo que vivemos, a própria morte, que nos levará, não poderá tomar de nós os bens imortais, diz Epicuro, não porque não morremos, mas porque a morte não poderia anular o que vivemos, o que fugidia e definitivamente vivemos. A morte só nos privará do futuro, que não é. A gratidão liberta-nos dele, pelo saber alegre do que foi. O reconhecimento é um conhecimento (ao passo que a esperança nada mais é do que imaginação); é por aí que ela alcança a verdade, que é eterna, e a habita. Gratidão: desfrutar eternidade.
Isso não nos restituirá o passado, objetar-se-á a Epicuro, nem o que perdemos...Sem dúvida, mas quem pode fazê-lo? A gratidão não anula o luto, consuma-o: ”É necessário curar os infortúnios com a lembrança reconhecida do que perdemos, e pelo saber de que não foi possível tornar não-consumado o que aconteceu. Pode haver formulação mais bela do trabalho de luto? Trata-se de aceitar o que é, também o que não é mais, e de amá-lo como tal, em sua verdade, em sua eternidade: Trata-se de passar da dor atroz da perda à doçura da lembrança, do luto a consumar ao luto consumado (“a lembrança reconhecida do que perdemos”), da amputação à aceitação, do sofrimento à alegria, do amor dilacerado ao amor apaziguado,. “Doce é a lembrança do amigo desaparecido” dizia Epicuro - a gratidão é essa própria doçura, quando se torna alegre. No entanto, o sofrimento é mais forte primeiro: “Que terrível ele ter morrido!” Como poderíamos aceitar? Por isso o luto é necessário, por isso o luto é difícil,, por isso é doloroso. Mas a alegria retorna, apesar dos pesares. “Que bom ele ter vivido!” Trabalho de luto: trabalho de gratidão.
...A gratidão é alegria, repitamos, a gratidão é amor...Alegria somada a alegria: amor somado a amor. A gratidão é nisso o segredo da amizade, não pelo sentimento de uma dívida, pois nada se deve aos amigos, mas por superabundância de alegria comum, de alegria recíproca, de alegria partilhada. “ A amizade conduz sua dança ao redor do mundo”, dizia Epicuro, “convidando todos nós a despertar para dar graças”. Obrigado por existir, dizem um ao outro, e ao mundo e ao universo. Essa gratidão é de fato uma virtude, pois é a felicidade de amar e é a única.

André Comte-Sponville - A Gratidão (fragmentos).


Onde:

Pequeno Tratado das Grandes Virtudes # André Comte- Sponville
Ed. Martins Fontes

http://www.imagenesyfotosde.com/2014/01/imagenes-de-gracias-parte-4.html

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Histórias sem pé nem cabeça: as mentiras sobre Lula




 “Lula é vítima de boatos e mentiras há muitos e muitos anos, desde que passou a representar uma séria ameaça aos grupos que controlaram o país durante décadas a fio” diz a página criada pelo Instituto Lula para desconstruir alguns dos principais mitos, calúnias e difamações que se espalharam na sociedade a respeito da atividade pública e da vida privada do ex-presidente.

Já era tempo. Essa narrativa fraudulenta e fabulosa se propaga como rastilho de pólvora e, de tanto ser repetida e reiterada, converteu-se em crenças arraigadas e certezas inabaláveis. Ela também alimenta a caldeira de ódio, fanatismo e irracionalidade que abastece a massa conservadora e a oposição ao governo. O mesmo método preconizado pelo ministro nazista Joseph Goebbels, especialista em propaganda política e lavagem cerebral: "uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade".

Muitos conhecem a historinha do indivíduo que espalhava boatos e mentiras sobre um desafeto e recebeu dura sentença do Juiz (era um Juiz que honrava a toga), acompanhada da seguinte fundamentação: "o ataque à reputação de uma pessoa é como um travesseiro de penas rasgado ao vento. Fácil de destruir e impossível de ser recomposto depois".

A pesquisa coordenada pelos professores Pablo Ortellado (USP) e Esther Solano (Unifesp) e realizada na Av. Paulista, entre os manifestantes do "Fora Dilma", comprova isso. Absurdos como "o PCC é braço armado do PT "; "o PT quer implantar o comunismo no Brasil; "o Lulinha é sócio da Friboi"; "o PT trouxe 50 mil haitianos para votar na Dilma nas últimas eleições"; "os desvios da Petrobrás são o maior caso de corrupção do Brasil" etc são aceitos como dogmas. Esses grupos convivem em ambientes onde grassam fofocas, manchetes sensacionalistas, maledicências de toda ordem e desinformação. São pessoas que protestam contra a corrupção, mas se valem de fatos adulterados, argumentos desonestos, montagens, photoshops e toda sorte de mentiras para sustentar a própria ideologia. Afinal, os meios justificam os fins, não é mesmo? Vale tudo para tirar o PT do poder: de golpe militar a sangramento sem trégua, passando pelo infindável terceiro turno.

É preciso levar essa situação a sério. Do jeito que está, ela deforma a Democracia, enfraquece as instituições, interdita o convívio social respeitoso, compromete o pluralismo e obstrui o livre debate. A Política é uma atividade civilizadora. Ela possibilita a resolução de diferenças e conflitos por meios justos, pacíficos e não-violentos. Boatos, factóides, embustes são violência simbólica e precisam ser respondidos um a um, imediatamente, nas redes sociais, no Judiciário, nos comunicados oficiais, em artigos e entrevistas. Eles são prejudiciais porque atingem o âmago do processo democrático: a  liberdade de escolha com base em informações corretas e íntegras. O direito à informação é sagrado em uma sociedade democrática.

A mídia tem enorme responsabilidade na construção dessas narrativas, seja por produção e replicação de mentiras, seja por distorção e omissão de verdades. Ela tem lado e interesses próprios e milita agressivamente em favor deles.

É assim que as forças progressistas perdem a batalha da comunicação para a mídia e seus apaniguados: deixando que eles comandem a narrativa que prevalece e deixando sem resposta os factóides, as manipulações e as escandalizações do nada.


Onde:

http://institutolula.org/mitossobrelula/

http://www.lage.ib.usp.br/manif/

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Napoleão Mendes

#DevolveGilmar - por Munir Ahmed



Onde:

http://jornalggn.com.br/noticia/devolvegilmar-por-munir-ahmed

terça-feira, 14 de abril de 2015

E, sobretudo, tem que ter rio!




"Tem gente que precisa aprender a pescar, mas para pescar precisa ter a vara, precisa ter força pra chegar até o rio, para lá lançar o anzol."


Dom Mauro - Arcebispo de Cascavel em defesa do Bolsa Família


Onde:

http://www.climatempo.com.br/noticias/304509/sem-chuva-cantareira-estabiliza/

https://www.youtube.com/watch?v=iIDBTjtjU6k

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Pó de estrelas

O nascimento de uma galáxia # Max Ernst



Pó de Estrelas

Maria Maia

pó de estrelas
restos que somos
brilhamos, no entanto

canto tanto
e recebo em minha trova
asteróides, supernovas

pela dobra
da obra
só espanto

para o sopro desarmado
sobra o pó


Onde:

http://www.wikiart.org/en/max-ernst/birth-of-a-galaxy-1969

...e poema direto do forno.

domingo, 12 de abril de 2015

Representantes de quem?

(Veja a charge com nitidez no site do Sindicato dos Bancários - SP)


Eis aqui o resultado da votação do PL 4330, sobre a Terceirização, na Câmara dos Deputados. Nas próximas eleições  os trabalhadores brasileiros retribuirão com a mesma moeda, nas urnas, cada voto dado a favor ou contra a dignidade do trabalho e os avanços dos direitos sociais. 




Onde: 

http://www.spbancarios.com.br/Charges.aspx#

http://www.spbancarios.com.br/Pagina.aspx?id=357

sexta-feira, 10 de abril de 2015

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Nham nham nham: delícia de Páscoa



Oferecer cupcakes feitos em casa, acompanhados por um lindo cartãozinho, é um jeito pessoal, original, não-consumista, de celebrar a Páscoa e demonstrar o afeto com delicadeza e carinho. 
A receita é ótima e os bolinhos dão de 10 a zero nos ovos industrializados.  Para os que têm intolerância à lactose, a cobertura poderá ser  trocada por geleia, calda de chocolate ou de frutas vermelhas, cremes diversos (ameixa, damasco, coco, suspiro, e o que a imaginação inventar).



Cupcake de Páscoa da Carol


120g farinha de trigo

70g cacau em pó

150g açúcar

170g beterraba cozida

2 ovos

3/4 xícara de azeite de oliva

1 colher de chá de essência de baunilha

1 1/2 colher de chá de fermento químico

Bata a beterraba, o azeite, os ovos e a baunilha no liquidificador. Em uma tigela, junte os ingredientes secos à mistura de beterraba. Distribua a massa crua nas forminhas de silicone (encha 3/4 do recipiente)  e disponha as forminhas numa assadeira (diretamente na superfície , sem necessidade de banho-maria).. Asse em forno preaquecido a 180◦ por cerca de meia hora. Rende uns trinta bolinhos.


OBS: Se preferir, a beterraba poderá ser substituída por cenoura cozida.




Cobertura de cream cheese

200g de açúcar de confeiteiro

40g de manteiga em temperatura ambiente

150g de cream cheese gelado


Na batedeira, bater o açúcar e a manteiga até formar um creme homogêneo. Juntar o cream cheese e bater até que a consistência fique firme - demora um tempo.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Pai, afasta de nós este cálice




Pedir ditadura na democracia é moleza. Difícil é pedir democracia na ditadura.


    Cálice (Chico Buarque - Gilberto Gil) # Pitty

    quinta-feira, 2 de abril de 2015

    O doloroso processo de fim da impunidade

    (Nada a ver com a vassoura golpista de Jânio Quadros)


    "Rien ne ressemble plus à une ruine qu'une construction inachevée."


    "Nada se parece mais com uma ruína que uma construção inacabada."

    Fernand Jacquemart - Les Liens de la terre





    A mídia brasileira sabe que a Casa Grande não passa de um inferninho, com um vasto laranjal nos fundos. No mínimo, um pardieiro, onde acontece de tudo: barracos escandalosos; sonegações bilionárias; remessas ilegais a paraísos fiscais; propinas; helicocas; aeroportos públicos de uso privado; jatinhos sem dono; subornos; fraudes; conspirações; compra de sentenças, manobras judiciais. É preciso apertar nariz quando se levanta o tapete da sala: há coisas podres, podríssimas, podrérrimas. Melhor seria deixar quieto, mas a situação fugiu ao controle. Os vazamentos seletivos e os ataques pinçados a dedo já não funcionam como antes, só para os desafetos. Por isso é que há tanta fúria, histeria, desassossego.
    Alô, Alô, classe média! Caia na real: alguma vez na vida você já assistiu à investigação de empresários, lobistas, banqueiros, políticos, empreiteiros, midiáticos, juízes, servidores públicos bandidos?
    Eu também não. 
    Sinal que os órgãos e instituições começam a fazer o que deveriam ter feito desde sempre: funcionar de fato, sem favorecimentos. 
    Estamos vivendo um duro e doloroso processo de fim da impunidade, e ele está sendo percebido, inicialmente, como aumento da corrupção. Não é. NÃO É MESMO! A corrupção continua igualzinha ao que era antes. A diferença é que agora o cheiro do lixo debaixo do tapete é indisfarçável, irrespirável e chegou às narinas de todos. O chorume está sendo trazido à luz para ser conhecido, desinfetado, descartado. 
    Até que enfim! 
    VIVA A DEMOCRACIA!



    Onde:

    https://books.google.com.br/books?id=9fYQm2szhE4C&printsec=frontcover&dq=Les+liens+de+la+terre+books.+google&hl=en&sa=X&ei=e1wdVe2SCY-YyASsqoCwCQ&ved=0CBwQ6AEwAA#v=onepage&q&f=false