sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Hora da verdade ou crime sem castigo?

Verdade resgatada pelo Tempo, testemunhada pela História # Francisco Goya



Retrós e linhas (Hermínio Bello de Carvalho  - Martinho da Vila) # Alaíde Costa



VAI FICAR POR ISSO MESMO?


Paulo Moreira Leite


O golpe eleitoral midiático destinado a interferir na eleição presidencial completa uma semana hoje e cabe perguntar: vai ficar tudo por isso mesmo?
É curioso registrar que estamos diante de um caso que a Polícia Federal e o Ministério Público têm todos os meios de apurar e chegar aos responsáveis sem muita dificuldade, até porque muitos nomes são de conhecimento público. Não é diz-que-diz. Nem simples cortina de fumaça.
Os indícios criminais estão aí, à vista de 140 milhões de eleitores.
Até o momento, temos uma discussão de mercado. Jornalistas debatem o que aconteceu, analistas dão seus palpites, políticos de um lado de outro têm sua opinião. Não basta.
Está na hora daquelas autoridades que falam em nome do Estado brasileiro cumprirem o dever legal de garantir os direitos dos cidadãos de escolher os governantes através de eleições livres e limpas, sem golpes sujos.
O golpe midiático não foi um ato delinquente sem maiores consequências. Trouxe prejuízos inegáveis a candidatura de Dilma Rousseff e poderia, mesmo, ter alterado o resultado da eleição presidencial — a partir de uma denúncia falsa. Mesmo eleita, é inegável que Dilma saiu do pleito com um desfalque de milhões de votos potenciais, subtraídos nas últimas 48 horas. “Se a eleição não fosse no domingo, ela até poderia ter perdido a presidência,” admite um membro do Ministério Público Federal.
Boa parte da investigação já está pronta. Sabemos qual o lance inicial — uma capa da revista VEJA, intitulada “Eles sabiam de tudo”, dizendo que o doleiro Alberto Yousseff dizia que Lula e Dilma estavam a par do esquema de corrupção. Sabemos que, prevendo uma possível ação judicial, a própria revista encarregou-se de esclarecer que não podia provar aquilo que dizia que Yousseff havia dito. O próprio advogado de Yousseff também desmentia o que a revista dizia. Mesmo assim, VEJA foi em frente, espalhando aquilo que confessadamente não poderia sustentar.
Seria divulgado, mais tarde, que a referência a Lula e Dilma, uma suposição (alguma coisa como “é dificil que não soubessem”) sequer fora feita no próprio depoimento a Polícia Federal, mas numa segunda conversa, 48 horas depois.
Se essa hipótese é verdadeira, isto quer dizer que a própria frase da capa, “eles sabiam de tudo”, pode ter sido obtida artificialmente, sem caráter oficial, apenas para que fosse possível produzir uma manchete na véspera da eleição.
Colocada diante de um fato consumado, Dilma foi levada a gravar um pronunciamento para seu programa político. O assunto foi tema no debate da TV Globo, na noite de sexta-feira. Também foi tratado pela Folha de S. Paulo, no dia seguinte, e no Jornal Nacional, menos de doze horas antes da abertura das urnas e dos primeiros votos.
Se antecipou a impressão e distribuição da revista em 24 horas, num esforço para garantir de qualquer maneira que a acusação que não podia ser provada contra Dilma e Lula tivesse impacto sobre os eleitores, a revista também fez um esforço especial de divulgação. No sábado, espalhou out-doors pelo país e foi acusada de não acatar decisão judicial para que fossem retirados — pois o próprio texto do anúncio servia como propaganda negativa contra Dilma. Obrigada a publicar um direito de resposta em seu site, a revista respondeu ao direito de resposta, o que é um desrespeito com a vítima.
No domingo, quando o doleiro Alberto Yousseff foi internado por uma queda de pressão, a pagina falsa de um site de notícias de grande audiência circulou pela internet, dizendo que ele fora assassinato num hospital de Curitiba. No mesmo instante, surgiram cidadãos que gritavam em pontos de circulação que Yousseff fora assassinado numa queima de arquivo, numa campanha de mentira que ajudou a elevar a tensão entre militantes, ativistas e cabos eleitorais de PT e PSDB.
O ministro José Eduardo Cardozo teve de intervir pessoalmente para desmentir a mentira.
Talvez não seja tudo. Olhados em retrospecto, os números risíveis de determinados institutos de opinião, que apontavam para uma vantagem imensa e ridícula de Aécio Neves sobre Dilma, poderiam servir para dar sustentação a trama.
Caso o golpe midiático viesse a ser bem sucedido, produzindo uma incompreensível virada de última hora, estes números de fantasia poderiam ser usados como argumento para se dizer que a candidata do PT já estava em queda e que sua derrota fora antecipada em algumas pesquisas. Verdade? Mentira? Cabe investigar.
Há uma boa notícia neste campo.
No final da tarde de ontem, era possível captar sinais de que uma investigação oficial sobre o golpe midiático pode estar a caminho. Cabe torcer para que isso aconteça e que ela seja feita com toda seriedade que o caso merece.O eleitor agradece.



Onde:

Alaíde Costa canta Hermínio Bello de Carvalho

http://paulomoreiraleite.com/2014/10/31/vai-ficar-tudo-por-isso-mesmo/

http://www.wikiart.org/en/francisco-goya/sketch-for-truth-rescued-by-time-witnessed-by-history-1800

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

É impossível ser feliz sozinho







Wave ( Tom Jobim) # Nara Leão e Roberto Menescal



LULA: SÓ O QUE QUEREMOS É SOCIALIZAR A FELICIDADE

Fernando Brito


A fala de Lula divulgada hoje só tem uma coisa errada.

Deveria estar na TV aberta, não no Youtube.
Seria absolutamente natural como jornalismo, pois se trata de um ex-Presidente, vencedor de eleições ele próprio por duas vezes, e que, por mais duas vezes, saiu vitorioso como principal referência da eleição de Dilma.
Aliás, não seria apenas jornalismo com também um grande serviço público, pois se trata de um convite ao desarmamento de espíritos, à capacidade de convívio civilizado e ao bom funcionamento do país.
Infelizmente eu e você sabemos que é muito mais fácil que as tevês brasileiras veiculem a conversa de outros, mais interessados em proclamar como “venceram na derrota” e a dizer o que “exigem” que o governo faça ou deixe de fazer.
Quanto a Lula, o que os jornais se apressam em dizer, é que ele quer “interferir” no Governo Dilma.
E deixam de observar o obvio, que está expresso na camiseta inusual com que ele gravou o vídeo que reproduzo abaixo.
Lula vai assumir o comando não do Governo, mas de seu partido, o PT.
E tentar devolver a ele o discurso que faz, o do progresso social e da ampliação de oportunidades, sem exclusões.
A capacidade de falar às pessoas.
Lula percebeu que transferiram ao PT o ódio que não puderam dirigir a ele.
Por isso, ao mesmo tempo, adota o discurso anti-divisão.
Que azeda e estraga a vida, inclusive seus momentos de festa democrática.
Lula resgata o verso de Tom Jobim – “é impossível ser feliz sozinho” – e cria um caminho para sua reentrada no mundo da política.
O da socialização da felicidade.



Onde:

Garota de Ipamema # Nara Leão

http://tijolaco.com.br/blog/?p=22603

domingo, 26 de outubro de 2014

Ufa! Viva a raça brasileira!





O POVO ESCOLHEU QUEM NÃO VAI JOGAR A CONTA DA CRISE NAS COSTAS DELE

Paulo Nogueira*

Foi uma vitória épica de Dilma, não pelos números, definitivamente apertados, mas pelas circunstâncias em que ela ocorreu.
Dilma teve tudo contra ela.
Primeiro, uma mídia sempre disposta a miná-la, ou com certa sutileza, como fez a Globo, ou com total despudor, como foi o caso da Veja.
O ponto máximo dessa guerra da imprensa contra Dilma se deu a dois dias das eleições, quando a Veja antecipou uma capa com acusações gravíssimas contra ela e Lula sem prova nenhuma.
Mais uma vez – não por coincidência – explodiram denúncias estrepitosas de corrupção às vésperas das eleições.
Tem sido sempre assim.  Os escândalos ganham as manchetes na hora em que os brasileiros pegam seu título de eleitor na gaveta.
A grande inovação, neste campo, veio de Dilma.
Ela encontrou um argumento que a fez sair da defesa para o ataque: mostrou, com clareza, quanto era oco o discurso moralista do PSDB.
A única diferença a favor dos tucanos, demonstrou Dilma, é que a corrupção do PSDB ao longos dos tempos não é noticiada e nem punida.
Da compra de votos para a reeleição de FHC ao dinheiro público posto por Aécio na construção de um aeroporto para uso privado, é extensa a lista de casos de delinquência tucana varrida para debaixo do tapete.
Dilma expôs a corrupção sob um novo ângulo, o do cinismo farisaico, e isto contribuiu poderosamente para sua vitória.

Daqui por diante, é presumível que os conservadores brasileiros procurem um novo caminho para atacar a esquerda, uma vez que o moralismo foi desmascarado espetacularmente depois de vitimar, no passado, Getúlio e Jango.
Dilma teve que enfrentar também durante sua campanha uma dramática crise econômica mundial, da qual país nenhum – nem a China  – conseguiu escapar.
Seus adversários – de Aécio aos colunistas econômicos — tentaram ardilosamente atribuir a ela os problemas econômicos decorrentes da crise mundial, como se o Brasil fosse um patinho feio em meio a cisnes belos e felizes.
No debate econômico, particularmente, Dilma teve a seu favor a internet — o jornalismo digital. Milhões de brasileiros encontraram em sites jornalísticos independentes contrapontos ao discurso único das grandes empresas jornalísticas.
Dilma não terá tanto tempo assim para comemorar. 2015 vai ser um ano duro. A economia mundial continuará em crise, e o Brasil vai ter que lidar com isso.
Diante dessa perspectiva, os eleitores, ou por cálculo ou por instinto, fizeram a escolha melhor para eles.
No modelo representado por Aécio, a conta de uma crise é posta nas costas dos chamados 99% — o povo.
O nome bonito que se dá à pancada no povo é “ajuste”. Você corta custos de programas sociais, aumenta os juros para diminuir o consumo e frear a inflação – e ao fim de tudo isso brota  uma recessão que ceifa empregos e massacra os salários.
Num momento de rara franqueza pouco antes da campanha, Aécio prometeu a empresários “medidas impopulares”.
No modelo representado por Dilma, há um esforço concentrado para poupar ao máximo os trabalhadores dos efeitos de uma crise.
A voz rouca das ruas fez a escolha por quem a protegerá mais – e quem poderia culpá-la por agir assim?



*Paulo Nogueira é jornalista; trabalhou na Veja, Exame, Época, Globo e atualmente é diretor editorial do site de notícias e análises Diário do Centro do Mundo.


PS da Cafu - Não dá pra esquecer o "singelo" episódio que esteve rondando as urnas hoje como uma assombração: 

http://mudamais.com/divulgue-verdade/militancia-tucana-espalha-boato-criminoso-nas-redes-sobre-youssef-e-tudo-mentira

..."Mas a minha filosofia é cantar os meus versos com simplicidade. É mostrar que o morro  também tem direito à felicidade. Eu sou barro, eu sou chão, eu sou pó, eu sou poeira. Sou filha desse torrão, eu sou a raça brasileira."

E aí larari larara lariri, lariri. Pom, pom, pom, pom, pom pom...




Onde:

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-povo-escolheu-quem-nao-vai-jogar-a-conta-da-crise-nas-costas-dele/

sábado, 25 de outubro de 2014

Meu voto, nosso voto

Os direitos do homem # Shigeo Fukuda






Meu voto, nosso voto

Evergton Sales Souza*

Aprendi, desde cedo, que numa democracia o meu voto não deveria servir a mim mesmo. Ele deveria servir a um universo maior de indivíduos. Maior, por exemplo, do que a categoria à qual pertenço, a de professores universitários. Num país com tantos problemas, também não deveria pensar apenas na defesa dos meus interesses de cidadão de classe média. Meu voto, meu sagrado voto, desde sempre, foi usado em defesa dos que mais precisavam dele, razão pela qual ele não é apenas meu, mas nosso voto. 
Venho de uma cidadezinha do semiárido baiano. Passei ali, em Bom Conselho, boa parte da minha infância e toda a adolescência. Sei bem o que era a seca. Vi flagelados famélicos saquearem armazéns do governo em busca de comida. Vi gente mendigando água em carros-pipa. Vi muitos amigos partirem para longe, em busca de trabalho e pão. E tantos outros, pobres lavradores sem terra, obrigados a vender seu trabalho por um prato de comida. 
Há alguns anos essa realidade foi alterada. A introdução do bolsa família – sim, aquela bolsa tão duramente criticada pela oposição ao governo Lula – cumpriu um papel fundamental nesta mudança. Há dois anos atrás, o Nordeste da Bahia e boa parte de Sergipe passaram por uma seca terrível. Meu pai, que continua a morar em Bom Conselho, sempre me dava notícias sobre a dureza do tempo, a mortandade do gado, os inevitáveis prejuízos de agricultores e pecuaristas. Mas fazia uma ressalva que podia ser constatada por qualquer um: não havia gente passando fome, não havia êxodo, não havia flagelados! Não faltava água para as pessoas. Fora do tempo de seca, também mudou a vida do lavrador que, dotado de uma renda mínima, não precisa mais se dobrar aos imperativos do estômago e vender sua jornada por um valor abaixo do que seria minimamente justo.
Meu voto, nosso voto, deverá servir a eles, mas também a muitos outros. Aos beneficiários das políticas de cotas, das políticas de expansão do ensino técnico e do ensino universitário. Àqueles que ainda precisam realizar o sonho de ter a sua própria casa. A todos os que desejam e devem ter uma vida melhor. A todos os que almejam um Brasil mais justo. 
É voto de quem, como tantos dentre nós, trilhou um longo e improvável caminho até conquistar um lugar ao sol. De quem viveu as dificuldades de uma família pobre para conseguir dar uma formação universitária aos filhos numa capital a 300 km de distância de sua cidade. Mas que não se engana sobre o quanto as políticas de Estado – ensino gratuito, bolsas de estudo etc. - foram importantes para que o sonho virasse realidade.
Meu voto, nosso voto, é o de quem se importa com o outro, de quem compartilha e de quem é solidário. É voto de quem conserva a esperança e convicção de que a política é o lugar do debate e da transformação. Lugar, também, de respeito às opiniões divergentes e de pleno exercício da arte do argumento e do convencimento. Também é voto de quem luta por democracia e pluralidade nos meios de comunicação! De quem apoia e cobra a implementação de políticas inclusivas e de afirmação dos direitos das minorias. De quem não compactua com erros e desvios.
Meu voto, nosso voto, é de quem ama e protesta!



*Historiador (UFBA) e Pesquisador do CNPq



Onde:

Nos comentários do post abaixo, no blog  Tijolaço, de Fernando Brito:

http://tijolaco.com.br/blog/?p=22477

http://gurafiku.tumblr.com/post/1680909305/japanese-poster-human-rights-shigeo-fukuda-1989

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

Das comparações necessárias




Sangue de nordestino (Luis Guimarães) # Luiz Gonzaga e Fagner




Onde:

Da sanfona à sinfônica - 40 anos de arranjos # Wagner Tiso

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Alô, Alô, Sabesp, a onça está com sede!

O ódio, a sede e a onça # Charge de Laerte




A  tragédia paulista da falta de governo


Luis Nassif

São Paulo tornou-se um buraco negro institucional. Praticamente todos os vícios que os grupos de mídia apontam no governo federal vicejam em São Paulo com muito maior intensidade, devido à falta de vigilância tanto da mídia quanto dos demais poderes.
Por aqui consolidaram-se vícios de estados atrasados.
Por exemplo, no Ministério Público Estadual, o cargo de Procurador Geral do Estado é um trampolim para uma futura secretaria de governo. Apesar da existência de procuradores aguerridos, há uma evidente subordinação do PGE ao grupo político que controla o Estado.
No caso dos grupos de mídia, a ideia fixa em se apresentar como condutora da oposição bloqueou a fiscalização de todos os atos de governo.
É por isso que se chegou à iminência do maior crime já cometido contra a população de São Paulo, que será o racionamento desorganizado de água que se prenuncia.
A falta de água, especialmente em regiões menos assistidas, exporá a população a epidemias, aumento da mortalidade infantil. Se se chegar a esse ponto e as estatísticas apontarem essa letalidade, Alckmin, Mauro Arce, a Secretária Dilma Penna, o presidente da Sabesp estarão expostos a processos criminais, sim.
Quando foi depor na CPI da Assembleia Legislativa, Dilma Penna mostrou o desconforto com a situação, deixou claro que a irresponsabilidade vinha do governo do Estado, não dela. No dia seguinte, notas em jornais davam-na como demissionária por ter “perdido o comando”, sabe-se lá sobre o quê.
Incúria ocorreu nos últimos anos, com o descaso da Sabesp em relação a um problema anunciado desde 2004. Mas nos últimos dois anos, a crise estava posta e a falta de ação enquadra-se em crime muito mais grave.
Por conta do período eleitoral, o médico Alckmin não cuidou de planejar um rodízio preventivo, responsável. Pensasse um pouco maior, aproveitaria o momento para ser o verdadeiro líder, que não foge do problema e comanda a reação contra o adversário: a falta de água. Em vez disso, fugiu da questão e de suas responsabilidades por mero oportunismo eleitoral.
Nos últimos anos, São Paulo viveu a maior enchente da sua história. A razão foi a imprevidência do então governador José Serra, cortando verbas destinadas ao desassoreamento do Tietê. Essa razão básica foi sonegada dos paulistanos pela mídia.
Em nome da luta política maior, todos os demais problemas paulistanos foram varridos para baixo do tapete, o desmonte das universidades estaduais, dos institutos de pesquisa – Agronômico, Butantã -, das instituições de planejamento – Fundação Seade, Cepam, Emplasa -, do Museu do Ipiranga, do Instituto Butantã, da Fundação Padre Anchieta, o aparelhamento da estrutura cultural.
Além disso, o discurso viciado, preconceituoso e agressivo da mídia modelou o personagem médio mais execrável do cenário político brasileiro: o cidadão que tirou o preconceito do armário e invadiu as ruas armado da agressividade mais inaudita.
São Paulo não é isso.
Esse exército de zumbis floresce em uma sociedade organizada, com movimentos sociais de vulto, vida cultural dinâmica, uma parte da elite moderna, de ONGs que fazem trabalhos exemplares, algumas cabeças empresariais arejadas.
Esse circo de horrores foi modelado por uma mídia que perdeu qualquer noção de responsabilidade.


Onde:

http://jornalggn.com.br/noticia/a-tragedia-paulista-da-falta-de-governo

http://blogdomariomagalhaes.blogosfera.uol.com.br/2014/10/21/o-odio-a-onca-e-a-sede-por-laerte/

terça-feira, 21 de outubro de 2014

A "velha corrupção"

Charge de Duke


Homenagem ao Malandro (Chico Buarque) # Chico Buarque



A “Velha Corrupção” (carta aberta aos jovens sobre as eleições)

Sidney Chalhoub*



A violência do debate eleitoral no momento causa perplexidade aos jovens de idade semelhante aos que tenho em casa, que talvez acompanhem pela primeira vez, “ligados” de verdade, uma campanha eleitoral dessa importância para o país.

Especialmente em São Paulo, a grande imprensa produziu um verdadeiro clima de guerra civil midiática em torno desta eleição, desinforma o quanto pode, confunde e manipula.

São anos a fio de fogo cerrado contra o governo, em matérias jornalísticas cujos autores assumem o ar arrogante de ilibados defensores da ética e do interesse público.
A insistência no tema da corrupção, como se o atual governo tivesse inventado semelhante mostrengo, é uma combinação ácida de ignorância e hipocrisia.
Vamos primeiramente à ignorância histórica, na qual a grande imprensa chafurda com grande desenvoltura.
A corrupção está, por assim dizer, no código genético do Estado brasileiro.
Nas primeiras décadas após a Independência, período de formação do Estado nacional, a fonte principal da corrupção foi o tráfico ilegal de africanos escravizados.
Ao negociar o reconhecimento de nossa Independência no exterior, o Brasil contou com o apoio da Inglaterra em troca do compromisso de não continuar a capturar e escravizar africanos por meio do tráfico negreiro.
Em respeito aos acordos internacionais firmados pelo país, o parlamento brasileiro aprovou uma lei de proibição do tráfico africano em 7 de novembro de 1831. Todavia, os africanos continuaram a chegar.
Entre 1831 e o início da década de 1850, quando o tráfico realmente acabou por força da aplicação de uma nova lei, 750 mil africanos foram introduzidos no Brasil por contrabando e escravizados à revelia das leis do país.
O tráfico negreiro ilegal coincidiu com o desenvolvimento da cafeicultura no Vale do Paraíba fluminense e paulista. Em meados do século XIX, era comum que cerca de 80% dos trabalhadores das fazendas de café dessa região fossem africanos ilegalmente escravizados.
Para dizer as coisas com clareza: a riqueza dos barões do café e a prosperidade das províncias do Rio de Janeiro e de São Paulo foram construídas por meio da escravização em massa de africanos sequestrados em seu continente de origem e trazidos para o Brasil ilegalmente.
O negócio contou com a prática de corrupção em todas as escalas do governo do país e envolveu amplos setores da sociedade, desde os empresários envolvidos no tráfico, outros empenhados em manter a clandestinidade das operações, até os intermediários e fazendeiros que adquiriam os escravizados.
Basta de informação, oferecida aqui apenas para contrabalançar a ignorância histórica de boa parte da mídia nativa.
Em especial quanto aos jornalões do Estado de São Paulo, eles deviam enrubescer de vergonha cada vez que insinuassem a virtude própria para enfatizar a corrupção alheia.
Um deles, àquela época chamado A Província de São Paulo, foi fiel defensor dos proprietários de gente criminosamente escravizada.
Quanto a este assunto, desde a sua fundação, em 1875, foi conivente com a Velha Corrupção.
Sim, “Velha Corrupção”, para marcar bem o tamanho histórico do problema que os jornalões cismam de atribuir ao atual governo, apenas no intuito de desinformar e tentar influir no resultado das eleições.
Portanto, chega de hipocrisia, de usar dois pesos e duas medidas. No país independente, a corrupção surgiu junto com o Estado em formação, nele se incrustou e é uma tragédia que aí continue.
Assim como continua a grassar na sociedade, como parece óbvio, presente às vezes nas falas dos próprios sujeitos que, ao mesmo tempo, vociferam contra os corruptos no Estado e se dedicam com afinco a viciar concorrências públicas, a bolar estratégias para sonegar impostos diversos, até para ingressar nos aeroportos do país com muambas variadas e outras baixezas do gênero.
Chega de hipocrisia. Onde estava a disposição de investigação da grande mídia quando o governo do PSDB, segundo se dizia, comprava os votos de parlamentares para aprovar a lei que permitiu a reeleição de Fernando Henrique Cardoso?
O chamado “mensalão do PSDB mineiro”, origem do outro do qual tanto se falou, por onde anda? As denúncias de irregularidades nas privatizações tucanas de empresas públicas –algumas vendidas a preço de banana — mereceram a devoção investigativa da grande imprensa? Trens? Metrô? Tudo anda assim tão dentro dos conformes em São Paulo, a nossa Tucanolândia?
A corrupção é tema complexo e difícil.
Não há governante, no Brasil, que dê cabo disso numa penada. Muita coisa se pode e deve fazer para livrar o país da Velha Corrupção. Para começar, o governo precisa ter disposição para enfrentar o problema e tem de garantir a eficácia e a independência dos órgãos encarregados de investigar, processar e punir os responsáveis.
O governo Dilma foi exemplar nesses quesitos. Por conseguinte, a hipocrisia de caluniá-lo por isto é especialmente danosa à democracia e ao atual processo eleitoral.

*É historiador e professor da Unicamp








Onde:


Chico Buarque (1978)
 
http://dukechargista.com.br/

http://www.viomundo.com.br/politica/sidney-chalhoub-em-carta-aberta-jovens-eleitores-velha-corrupcao-brasil.html

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Vidas secas: antes e depois

Foto de Sebastião Salgado




A caatinga vista da lua (Eugênio Gomes) # Anna Lemgruber




O Brasil está passando por uma das maiores secas de nossa história. Por que não vemos, como no passado, as cenas dramáticas de esquálidos retirantes nordestinos fugindo em massa para o “sul maravilha”, ou multidões famintas saqueando mercados em busca de comida? Por que não temos apagão de energia no país, como nos anos FHC? Por que as imagens mais expressivas desta estiagem estão ligadas ao sistema Cantareira e à iminência de colapso no abastecimento de água em São Paulo? Ah, sim. Porque a Sabesp preferiu distribuir lucros para acionistas a investir em reparos, controle de desperdício, planos de contingência e proteção dos mananciais.

O Nordeste, finalmente, entrou pro orçamento da União. Isso se deu mediante políticas continuadas de inclusão social, estímulo ao desenvolvimento e promoção da cidadadia: programas como Luz pra Todos, Agricultura Familiar, Minha Casa, Minha Vida, Mais Médicosobras do PAC e transposição do São Francisco; construção de cisternas, portos, estradas, estaleiros; ampliação de vagas e criação de universidades federais novas, Pronatec, Reuni, ProUni...e também o Bolsa Família. 

O que o preconceito, o ódio e a desinformação não deixam perceber é a interdependência entre tudo e todos. Se o pobre tem luz elétrica, ele pode ter acesso a geladeiras e eletrodomésticos que o rico fabrica; se tem emprego, crédito ou renda mínima, ele consome alimentos, financia uma moto, adquire roupas, material escolar, produtos de higiene (conheço uma pessoa que viveu a infância e juventude na miséria e disse que o sonho dela era poder lavar o cabelo com shampu e tomar banho com sabonete), remédios etc. O valor individual do benefício é pequeno, mas o volume total representa bilhões de reais/ano circulando na economia. Da mesma forma, obras de infraestrutura geram empregos dentro e fora do lugar e demandam materiais de todo tipo e complexidade. Os empresários têm mercado para seus produtos, por conseguinte, trabalhadores têm empregos e governos recolhem impostos. O desenvolvimento de uma região favorece a melhoria do conjunto.




Os retirantes # Cândido Portinari



"...Fabiano ouviu os sonhos da mulher, deslumbrado, relaxou os músculos, e o saco da comida escorregou-lhe no ombro. Aprumou-se, deu um puxão à carga. A conversa de Sinhá Vitória servira muito: haviam caminhado léguas quase sem sentir. De repente veio a fraqueza. Devia ser fome. Fabiano ergueu a cabeça, piscou os olhos por baixo da aba negra e queimada do chapéu de couro. Meio dia, pouco mais ou menos. Baixou os olhos encandeados, procurou descobrir na planície uma sombra ou sinal de água. Estava realmente com um buraco no estômago. Endireitou o saco de novo e, para conservá-lo em equilíbrio, andou pendido, um ombro alto, outro baixo. O otimismo de Sinhá Vitória já não lhe fazia mossa. Ela ainda se agarrava a fantasias. Coitada. Armar semelhantes planos, assim bamba, o peso do baú e da cabeça enterrando-lhe o pescoço no corpo."

Graciliano Ramos - Vidas Secas (1938) (excerto)




Onde:

Vidas secas # Graciliano Ramos
Ed. Record


O negócio é amar # Anna Lemgruber

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

É mesmo?

Justiça # ???



É MESMO?

O mestre Zen Hakuin era honrado por seus vizinhos, que o viam como alguém que levava uma vida muito pura. Um dia descobriu-se que uma linda moça que vivia perto dele estava grávida. Os pais dela ficaram enfurecidos. A jovem não queria revelar quem era o pai da criança, mas, pressionada, ela disse que era Hakuin. Furiosos, os pais da moça o acusaram, mas ele disse apenas: "É mesmo?" Quando o bebê nasceu, foi levado a Hakuin, que cuidou dele. De seus vizinhos ele obteve leite e tudo que a criança precisava. Um ano depois a moça contou a verdade a seus pais: o pai da criança era um jovem que trabalhava no mercado de peixes. Os pais dela confessaram a verdade a Hakuin e lhe pediram perdão, mas o mestre respondeu apenas:"É mesmo? Agora levem seu bebê pra casa e cuidem muito bem dele".




TENTATIVA DE INTERFERÊNCIA NA DISPUTA ELEITORAL

Paulo Moreira Leite

Doutor em Direito, com curso de pós-graduação na Alemanha, o professor Luiz Moreira é um dos principais estudiosos da judicialização — aquele processo das sociedades contemporâneas pelo qual o poder judiciário busca interferir em decisões do poder político. Conselheiro Nacional do Ministério Público, Luiz Moreira condena com veemência o vazamento das informações de Paulo Roberto Costa e Alberto Yousseff a respeito do escândalo da Petrobras. Isso porque elas foram obtidas pelo regime de delação premiada — cujo pressuposto é o sigilo. “Cria-se a sensação de que estamos num vale tudo e que o sistema de justiça além de imiscuir-se na disputa eleitoral também não tem compromisso com a ordem jurídica,” diz Luiz Moreira. O professor deu a seguinte entrevista ao 247:

PERGUNTA – Como explicar que informações obtidas a partir de um acordo de delação premiada tenham vazado para os jornais, para o rádio e a TV?

LUIZ MOREIRA - Explica-se a partir de uma tentativa de interferência na disputa eleitoral. É lamentável que o sistema de justiça produza essa anomalia, ou seja, que um procedimento judicial cercado de técnicas sofisticadas de colhimento dos testemunhos simplesmente se volte contra a ordem judicial que determina seu sigilo. No fundo, esse vazamento deslegitima o sistema de justiça, porque ele perde sua imparcialidade, porque perde seu apego à legalidade.
Cria-se a sensação de que estamos num vale tudo e que o sistema de justiça além de imiscuir-se na disputa eleitoral também não tem compromisso com a ordem jurídica.

PERGUNTA - Por que nenhuma autoridade assume suas responsabilidades nessa situação?

LUIZ MOREIRA - Esta situação é fruto de uma covardia institucional que prospera em certos círculos, em que arestas são evitadas. Este é o ambiente propício para que interesses corporativos se sobreponham à República. Impressiona o silêncio das autoridades e a disseminação de uma cultura de desconfiança em que todos somos corruptos até que se prove o contrário. Este ambiente que produziu uma espécie de estado de exceção que ataca diretamente as liberdades e criminaliza a política. Claro que institucionalmente estas ações tem propósito eleitoral e político. Eleitoral porque é produzida para interferir no segunda turno das eleições presidenciais; política porque fabrica a submissão do Estado aos órgãos de controle e cristaliza o status quo.

PERGUNTA - Qual a justificativa para se manter a delação premiada sob sigilo?

LUIZ MOREIRA - Era de se esperar que o sigilo  durasse, no mínimo, até que o processo eleitoral fosse concluído. Fundamental para o sistema de justiça é a produção de segurança e que a sociedade lhe atribua respeitabilidade. Se o sistema de justiça passa a agir sem critérios mínimos e passar a se imiscuir na disputa eleitoral, deixa de ser visto como imparcial. O sigilo é inerente à delação premiada. Nesse sentido, os testemunhos só são verossímeis se acompanhados de provas. Sem provas, não têm qualquer valor jurídico.

PERGUNTA — Por que acreditar que as informações estão sendo divulgadas de forma seletiva?

LUIZ MOREIRA - A seletividade é óbvia. Explico: os depoimentos colhidos são tomados a partir de uma técnica sofisticada que garante o sigilo, protege os dados e impossibilita tanto a difusão do teor dos depoimentos quanto das informações colhidas. Nesse sentido, há uma engenharia responsável pelo vazamento que seleciona criteriosamente que partes devem ser divulgadas e o momento adequado para que o vazamento chame mais atenção e cause mais impacto nos eleitores. Estou afirmando claramente que há um projeto de poder nesses vazamentos, que tenta se sobrepor pelo medo, na medida em que produz uma chantagem institucional sem precedentes. Não por acaso as duas delações em que questão vazam, respectivamente, na reta final do primeiro turno e no início do segundo. Todo mundo sabe que seria possível aguardar o fim das eleições. Isso não iria interferir de forma nenhuma na produção de provas nem nos testemunhos.





Onde:

1001 pérolas de sabedoria budista # The Buddhist Society (Org.)
PubliFolha

http://paulomoreiraleite.com/2014/10/10/tentativa-de-interferencia-na-disputa-eleitoral/

domingo, 12 de outubro de 2014

Abra o olho

Eye colour # M.C. Escher






Visões (Luiz Tatit - Dante Ozzetti) # Dante Ozzete e Ceumar






Don't listen to what they say. Go see.

Chinese proverb



Não dê ouvidos ao que eles dizem. Vá ver.

Provérbio chinês





Onde:

Zen Soup # Laurence G. Boldt
Penguin Arkana


Achou # Ceumar


http://www.wikiart.org/en/m-c-escher/eye-colour

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Bolsa Família, desinformação e preconceitos

Desigualdade social # Fallindesign Studio






Saga de Severinin (Vital Farias) # Vital Farias




Sim, é fato: metade dos beneficiários do Bolsa Família não trabalham. Você sabe por quê? Porque são menores de 18 anos (42% têm menos de 16 anos). Em outras palavras, além de o programa aliviar a fome de milhões de pessoas em estado de vulnerabilidade extrema; refrear o êxodo rural para a periferia dos grandes centros urbanos; manter as crianças e adolescentes na escola; exigir pré-natal das grávidas e vacinação de mães e filhos; estimular o círculo virtuoso de produção e consumo na economia (25 bilhões de reais/ano injetados no comércio propiciam muitas compras e vendas), ele combate o trabalho infantil, que é crime e merece a desaprovação de todos nós. Ou não?

Se você não aprova que seu filho menor de idade, criança ou adolescente, deixe de estudar para ter de trabalhar, por que haveria de achar certo que isso aconteça com o filho do pobre? Crianças e jovens precisam ser protegidos e cuidados pelos adultos e pela sociedade, independentemente de qualquer condição.

A Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Tereza Campello, esclarece, pela enézima vez, - aqui em entrevista ao jornalista Paulo Henrique Amorim - os principais pontos desse importante instrumento de inclusão social e promoção de cidadania.

As informações abaixo são dirigidas aos que não estão envenenados por ódios, preconceitos e desinforfação e têm abertura para ver a realidade e os fatos com olhos livres. Os demais, são casos perdidos. Estão pouco se lixando para a verdade ou para a desigualdade. Querem mesmo é confirmar certezas; manter as coisas como estão;  interpretar o mundo para se dar razão e/ou defender privilégios; justificar comportamentos intolerantes e insensíveis e viver satisfeito e alienado na órbita do próprio umbigo.





o Conversa Afiada entrevistou a Ministra Tereza Campello do Desenvolvimento Social e do Combate à Fome.
O programa Bolsa Família atende 14 milhões de famílias que tem, na media, 3,6 membros.
É o maior programa do mundo, no gênero.
A tecnologia do cadastro do Bolsa o Brasil exporta para muitos países.
O Governo FHC, de fato, foi pioneiro na matéria, mas o programa não tinha cadastro … 
Não tinha como saber se sabe se entregava o beneficio, nem a quem entregava… 
E atingiu, no máximo cinco milhões de famílias. E como diz a presidenta Dilma, nos programas sociais, importa saber quantas pessoas são beneficiadas…

PHAEu vou conversar com Tereza Campello, que é Ministra do Desenvolvimento Social e do Combate à Fome. Ministra, a primeira pergunta que eu gostaria de fazer é a seguinte: a senhora concorda com essa vinculação que está sendo feita – e eu vi isso na Folha de SP e no jornal O Globo também – entre beneficiários do Bolsa Família e comportamento eleitoral. Faz sentido esse tipo de raciocínio? Ou seja, quem se beneficia do Bolsa Família tem um comportamento eleitoral padrão, previsível?

MINISTRA TEREZA CAMPELLOEu acho engraçado que os argumentos mudam ao sabor dos interesses. Eu lembro que, se você for olhar a imprensa uns 4 ou 5 meses atrás, todo mundo dizia exatamente o oposto. Todo mundo dizia que o Bolsa Família tinha influenciado muito as eleições de 2006 e de 2010, mas que já estava consolidado e, portanto, as pessoas não iam votar por causa disso. Aí, abriram as urnas e acham que votaram por causa disso. Então, primeiro que os argumentos mudaram de uma forma completamente radical.
A outra coisa que diziam era que todos os candidatos eram a favor do Bolsa Família. Aliás, pouca gente tem coragem de falar mal do Bolsa Família, não é, Paulo Henrique ? Você acompanhou o processo eleitoral e sabe que todos os candidatos se posicionaram a favor do Bolsa Família. Eu acho que essa é uma vitória do Bolsa Família, de um programa de transferência de renda com condicionalidades, que é um sistema brasileiro e que hoje serve de exemplo para o mundo todo. E que o conjunto dos políticos teve que se render às evidências científicas que mostram as qualidades do Bolsa Família, não só para aliviar a pobreza, mas para garantir as crianças na escola, saúde, vacinação, e para garantir o próprio funcionamento da economia. Então, eu diria ao contrário. Ninguém tem coragem de falar mal do Bolsa Família, porque se falar bem do Bolsa Família dá voto, se falar mal tira voto. Isso é líquido e certo.
Eu acho que as pessoas, antes de fazerem afirmações diretas como essas, deveriam olhar o conjunto do mapa e o conjunto dos outros indicadores econômicos.

PHAPor exemplo…

MINISTRA Por exemplo, falam muito que o Nordeste votou majoritariamente na Presidenta Dilma por causa do Bolsa Família, mas os indicadores no Nordeste são bons em todas as áreas. Não é só o Bolsa Família, que é excelente no Nordeste. Por que? Porque o Nordeste tem um nível de efetividade do Bolsa Família, os melhores cadastros do Brasil são do Bolsa Família, tem um nível de cobertura alta. (Além disso), o crescimento do PIB no Nordeste foi um crescimento chinês, o emprego no Nordeste aumentou muito. Nós temos obras estratégicas que foram feitas no Nordeste, exatamente porque o Nordeste era abandonado. Antes, quando você ia fazer qualquer grande atividade econômica, você fazia no Sul e no Sudeste. Essa visão política – essas grandes obras e grandes empreendimentos – seja no Ceará, Pecém, seja o Porto de Suape, em Pernambuco, sejam as obras do São Francisco. São obras importantes, que impactaram muito o Nordeste, e vão continuar impactando.
Então, eu acho que nós temos que olhar que o Nordeste se destacou num conjunto de indicadores, mesmo estando num período de seca. Então, quando a gente olha os indicadores, a gente vê: o PIB do Nordeste cresceu muito mais que no restante do Brasil, mesmo a gente estando vivendo um período de seca muito importante. A população não abandonou (o interior), não teve êxodo rural, mesmo com a seca. Quer dizer, a vida das pessoas melhorou, não obstante a seca, e isso logicamente que tem resultados.
Agora, o que eu temo, Paulo Henrique, e eu gostaria de aproveitar – porque a imprensa nesse momento tem um papel importante – porque eu acho que a gente não pode deixar que o preconceito contra os pobres e nordestinos aumente no Brasil.
Então eu temo que esse argumento de ficar jogando o Nordeste contra o Sudeste e o Sul, ficar dizendo que o eleitor do Bolsa Família é eleitor de cabresto, acaba estigmatizando ainda mais e dividindo o Brasil. E eu acho que isso não é bom para o país, independente da questão eleitoral. A gente tem que ter muito cuidado com esse tipo de argumento.

PHAEu posso entender do seu raciocínio que, como todos os candidatos defenderam o Bolsa Família todos os candidatos se beneficiaram do Bolsa Família?

MINISTRAPor que o Bolsa Família é tão valorizado ? O que estão querendo dizer é que esse voto é desqualificado. E é isso o que eu quero ir contra, que … era aquele antigo voto de cabresto, que foi substituído pelo Bolsa Família. A gente tem que ser radicalmente contra, porque essa foi uma vitória do Brasil. Eu acho que as pessoas votaram porque a vida delas melhorou, com o Bolsa Família, com o Pronatec, com o Mais Médicos, com o ProUni, com o FIES, com um conjunto de ações que beneficia a população pobre, beneficia a população negra, que majoritariamente está no Nordeste. Eu acho que essa é uma questão.
Agora, a outra questão é o oposto disso, que é aqueles que dizem que o voto do Bolsa Família é um voto de cabresto. O Brasil já teve um voto de cabresto, e o Bolsa Família é um voto bastante valorizado exatamente porque ele é um voto anônimo. Antes, as pessoas votavam em torno de uma quantidade de tijolos, em torno de um caminhão pipa… com o Bolsa Família, a pessoa tem um cartão e, se ela é pobre, ela recebe o cartão e esse dinheiro está desvinculado do que ela vai fazer. Ela precisa ser pobre e quem faz o cadastro do Bolsa Família é a prefeitura. São 5.570 prefeituras no Brasil, de todos os partidos, em todos os lugares. Hoje, quando os prefeitos cadastram, as pessoas estão se posicionando. Então, não dá para a gente fazer uma vinculação direta de um programa com o seu resultado, chamando de voto de cabresto, quando a pessoa recebe um benefício condicionado ao resultado das urnas. O Bolsa Família rompeu com isso. O cartão é impessoal, quem faz é o prefeito, independente do partido. A vitória do Bolsa Família é a vitória do fim do voto de cabresto.

PHAAgora, ministra, tem Bolsa Família em São Paulo?

MINISTRA - Tem. São Paulo é o segundo Estado com maior número de pessoas recebendo o Bolsa Família. O primeiro é Bahia, e o segundo é São Paulo. Proporcionalmente, menor. Mas, no ponto de vista absoluto, é uma população bem grande.
Esses são os Top Cinco do Bolsa Familia:
- Bahia, 1,8 milhão;
- São Paulo, 1,2 milhão;
- Pernambucao, 1,1 milhão;
- Minas, 1,1 milhão;
- Ceará, 1,1 milhão

PHA E o que a senhora acha de associar – como fez o ex-Presidente Fernando Henrique – o voto na Presidenta Dilma a um eleitor mal informado? A senhora diria que o beneficiário do Bolsa Família é mal informado?

MINISTRA - Eu acho triste a gente começar a chamar pobre de mal informado, nordestino de mal informado. Eu acho que isso é uma ofensa à população brasileira. E eu acho que a nós já temos tempo suficiente de Democracia no Brasil, programas e campanhas eleitorais livres, para que a gente precise ficar usando esse argumento.
Uma outra coisa que tem sido dita, e que eu também acho que é importante o uso da imprensa para esclarecer, é que, neste caso, o mal informado é aquele que não recebe o Bolsa Família, que acha que quem recebe o Bolsa Família não trabalha.

PHA É o Bolsa Esmola…

MINISTRAMetade do pessoal do Bolsa Família de fato não trabalha. Tem menos de 18 anos de idade. 42% tem menos de 16 anos de idade. Inclusive é crime trabalhar com menos de 16 anos de idade. E o Bolsa Família felizmente contribuiu muito para (evitar) o trabalho infantil.

PHADeixa eu entender os números, Ministra. Quantos têm menos de 18 anos?

MINISTRA - 49%

PHAE desses 49%, quantos têm menos 16?

MINISTRA42%.

PHAEntão não pode trabalhar…

MINISTRA Com menos de 16 anos, inclusive, é crime. Entre 16 e 18 anos pode trabalhar, em algumas condições. Mas, a gente quer que esses jovens e as crianças estejam na escola. A gente fala muito que o Brasil precisa aumentar a produtividade. Aumentar a produtividade generalizadamente. Como a gente pode melhorar a produtividade do Brasil? Melhorando a escolaridade da nossa população. Ou seja, quanto mais anos as crianças estiverem na escola, melhor. Então, estar na escola é um valor, e é um valor para o Brasil.
Agora, para os adultos que podem trabalhar, no caso do Bolsa Família, 75% dos adultos trabalham. Então, não é verdade que as pessoas recebem o Bolsa Família e estão encostados. Se a gente olhar nas redes sociais, na internet, isso cresceu muito, que a pessoa é encostada. Isso é desinformação de quem está bem de vida e tem preconceito contra a população pobre. As pessoas são pobres porque elas não tiveram acesso à oportunidade. E eu acho que essa é a grande agenda do Brasil. O Bolsa Família é uma oportunidade. Não só porque leva as crianças para a escola, leva as gestantes para o posto de saúde, mas é uma oportunidade, ao melhorar um pouco e aliviar um pouco a pobreza, também é uma oportunidade para essas pessoas.
Saiu recentemente um estudo em Harvard, que até o Dráuzio Varela reproduziu nesse final de semana, mostrando que a pobreza, a fome e o desalento prejudicam a tomada de decisão das pessoas. Falam assim “Ah, o pobre é burro”. Então, prejudica. Melhorar a condição de vida e aliviar a pobreza é bom para que essas pessoas tenham mais capacidade de tomar decisão. Agora, essas pessoas trabalham. 75% dos adultos do Bolsa Família trabalham. Isso está em linha, é o mesmo percentual dos que não são do Bolsa Família. Então trabalham tanto quanto os demais, do ponto de vista de percentual. Imaginando que eles trabalham mais arduamente, trabalham na construção civil, de sol a sol, com vendas. Muita gente trabalha vendendo coisa o dia inteiro embaixo de sol, trabalham carregando peso. É um trabalho, nesse sentido, da dureza do trabalho, trabalham muito mais do que nós. Então por que não ganham mais?

PHAOu seja, da população adulta que não está no Bolsa Família, 75% também não trabalham ?

MINISTRA - É. Da população economicamente ativa. Eles trabalham tanto quanto. 75% nos dois casos. Na PEA, que é a População Economicamente Ativa, é 75% para o Bolsa Família, e da população vai variar entre 74% e 76%. Então, não dá para acusar o Bolsa Família de que (levar) as pessoas parar de trabalhar.
Até porque o valor médio do Bolsa Família, e também é uma informação importante – porque muita gente é desinformada sobre o Bolsa Família – está em média R$ 168. Então, imaginar que um pai de família deixa de trabalhar para ganhar R$ 168 por mês é também muita desinformação.

PHAOu seja, Bolsa Família é o alvo principal do preconceito do brasileiro?

MINISTRAInfelizmente tem se tornado. Tinha diminuído, e essa eleição tem, infelizmente, se expressado para aumentar. A outra coisa que precisa (esclarecer), sabe o que é, Paulo Henrique? “Não pode ser só Bolsa Família”, que o Governo só dá o Bolsa Família. Isso também não é verdade. Isso também é muita desinformação. O Bolsa Família, na verdade, se tornou uma grande porta de entrada para um conjunto dos programas sociais do Governo, inclusive para os programas de qualificação deste público adulto. Por exemplo, estar no Bolsa Família é, também, uma garantia de receber informações sobre o Pronatec. Nós conseguimos levar para os bancos escolares 1 milhão e 400 mil pessoas pobres, que passaram a fazer cursos de qualificação profissional. Em áreas simples, modestas, mas que aumenta produtividade do Brasil.
Você vê… muita gente de classe média vive reclamando dos nordestinos, porque vai para as praias do Nordeste e falta garçom qualificado, falta camareira. É isso que nós estamos fazendo, qualificando auxiliar de cozinha, cozinheira, camareiro, costureira, eletricista, garçom, cuidador de idoso, cuidador de criança… e isso é bom para o Brasil todo. É bom que as pessoas saibam disso. Não é bom só para o pobre. É bom para ele e é bom para o Brasil ter gente qualificada e de produtividade. Aumentou o número de microempreendedores individuais formalizados do Bolsa Família. Aumentou o número de pessoas do Bolsa Família que tiveram acesso a crédito para produção. Portanto, melhoraram sua produção. O Brasil tem melhorado bastante, felizmente, e o Nordeste se destaca. Não só graças ao Bolsa Família, mas graças a esse conjunto de ações do setor público. E pela força do povo nordestino, que é um povo trabalhador e guerreiro, e que tem ajudado o Brasil a crescer.



Onde:

Cantoria 2 # Elomar, Geraldo Azevedo, Vital Farias e Xangai

http://www.conversaafiada.com.br/economia/2014/10/07/campello-desmonta-o-preconceito-contra-o-bolsa/

http://en.faldin.ru/artwork/?branch=2&id=162