segunda-feira, 6 de novembro de 2017

O silêncio das panelas

Charge de Genin



Perfil transverso de um delegado federal em notas insólitas

Armando Rodrigues Coelho Neto

O paneleiro vive hoje mergulhado em suas contradições, sentimento de engodo, gosto amargo do discurso que abraçou. Órfão e imóvel, a NASA já não informa o dia ideal e ensolarado para protestos. Talvez lhe falte os robozinhos da Rede Globo, MBL, Fundação Ford e PSDB para lhes lhe tirar da inércia. Antes, mais brasileiro que uma jabuticaba, ostentava cores brasileiras, atacava rancoroso elementares conquistas sociais. Hoje, envergonhado e perdido em suas contradições, o paneleiro se limita a dizer que é apartidário, que quer todos os corruptos presos. Alguns até dizem que votaram nulo, uma opção que se verdadeira fosse, reduziria a minguados 20% os votos de Aécio.

Mesmo assim, sobrevive um perfil torpe daqueles que, mesmo envergonhados, não dão o braço a torcer. Recentemente atacaram nas redes sociais um artigo publicado pelo ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão. No texto, o autor critica um decreto lesa-Pátria, assinado pelo impostor Michel Temer, que põe à venda sem licitação Banco do Brasil, Eletrobrás e Petrobrás, entre outros itens do patrimônio nacional. Aragão lembra que o fato se deu num dia imprensado (enforcado pela “ministra” Carmem Lúcia). Há contundente e provocativa critica à imobilidade social diante do saque à Nação.

Os setores retrógados, mesmo envergonhados pelo discurso hipócrita que impulsionou a troca insana da Presidenta Dilma pela corja de Temer, permanecem entorpecidos pelo ódio inexplicado (se é que ódio se explica). Torpedearam o texto do ex-ministro, na base do quem elegeu Temer foram os eleitores de Dilma. Distantes da realidade, tratam esse detalhe como se as condições de elegibilidade e pragmatismo eleitoral oferecessem opção. Ignoram um sistema no qual voto nulo ou branco contribui para eleger candidatos à Presidência da República. Num universo de dez eleitores, o vencedor precisa de seis. Se dois anulam, o vencedor precisa de cinco. São amarras inevitáveis do sistema.

Uma coisa é eleger um vice-presidente para situações pontuais, vinculado a um programa eleitoral. Outra coisa é tirar o programa aprovado nas urnas e colocar em prática o programa perdedor, sob a liderança de um vice traidor cooptado, via  trapaça e votos comprados por uma quadrilha. Mais que isso, manter um impostor na Presidência, que nela sobrevive à custa de manobras feitas não mais à sorrelfa, mas a olhos nus. Diferentemente do voto programático, o paneleiro, símbolo de classe média decadente, que Marilena Chaui chama de “uma aberração cognitiva”, seja o lá o que for que ela quis dizer com isso, votou em Aécio por ódio ao PT sob pretenso discurso moralista e econômico.

Nas redes sociais, paneleiros chamaram o ex-ministro de cínico, pois a crise não é obra de Temer e sim do PT, sem levar em conta a conjuntura internacional. Questões geopolíticas (como sugerem a espionagem da Presidenta Dilma e da Petrobras pela CIA) foram ignoradas. Idem a queda artificial do preço do barril de petróleo e suas conseqüências para um país que elegeu o Pré-Sal como eixo de sua plataforma de crescimento, com prioridade de investimento para a educação. Do mesmo modo, esqueceram dados elementares como a queda do preço das commodities e suas conseqüências para um país, cujo governo se quis derrubar sob desculpa do aumento em 0,20 centavos na passagem de ônibus no estado mais rico da federação.

 Erros do PT à parte, as práticas econômicas postas em prática eram de emergência frente à crise mundial, cujos reflexos no Brasil se minimizaram, justamente pela excepcionalidade de algumas medidas. Entre elas, o abrir mão de mão de impostos, os quais foram transformados em lucro pelas empresas e não em investimento. Por serem medidas emergenciais, seriam objeto de ajustes mais à frente, que o Congresso golpista frustrou, com irrestrito apoio da grande mídia, que se encarregou 24 horas por dia de potencializar a crise. Foi criado o clima de caos, derrotismo e bancarrota, desestimulando a economia, estimulando agências internacionais na desqualificação do Brasil. Disso se aproveitaram.

Hoje, quando as máscaras caíram, ainda surgem vozes para defender a venda subfaturada do país, sob a alegação de modernidade e do estado mínimo (melhor dizer ausente). Aqui neste espaço, divulgamos trecho de um velho manual da PF sobre o combate ao crime organizado. Nele, as privatizações são apontadas como fonte de corrupção, detalhe esquecido pela Farsa Jato.

O mundo das panelas raciocina com o umbigo, na base do “farinha pouca meu pirão primeiro”. É o pensamento dominante nas instituições encarregadas de tornar o Estado instrumento de realização do bem comum. Mas, o corporativismo de seus representantes negam o próprio Estado, e nessa condição se acham modernos. Desqualificam a essência do Estado, aprovam a venda do país, sem cotejar que historicamente, o Estado tem sido regido pelo espírito e ideário das classes dominantes. Digladiam-se com os males inerentes aos valores que cultivam, próprios da cultura de Moros, Marinhos, Malafais, Mesquitas, maçons...

Há algo de muito grave numa sociedade se julga moderna por aniquilar o estado. Que ignora 500 desempregados substituídos por uma única máquina. É moderno? Sim. É um ato social e humanizado? Não. Dá lucro? Sim. Vai ser socialmente distribuído? Não. Não é, portanto, um debate entre o moderno e o ultrapassado. Eis alguns paradoxos sobre dos que se julgam modernos numa sociedade em que defender a dilapidação do patrimônio nacional é ser top.

Quando o eixo de pensamento é dinheiro, lucro e ganância, não há dialogo produtivo com quem tem como eixo básico o olhar humanizado sobre o coletivo. O país que há pouco debatia direitos de empregadas domésticas, tentava regulamentar a profissão de motoqueiros é o mesmo que retorna ao trabalho escravo, extingue direitos sociais.

Agora, que caíram todas as máscaras, da Polícia Federal  a Sérgio Moro, de Aécio Neves a Gilmar, da Veja a Globo e de toda a denominada grande mídia, seria o caso de perguntar aos paneleiros o que efetivamente os fez irem às ruas para baterem panelas. Agora, que as camisas da CBF servem de vestimenta para mendigos nas ruas e as bandeiras enfeitam carroças de catadores de papel, nem é preciso perguntar o que o teria sido determinante o voto em Aécio Neves.

Agora, que o Congresso Nacional, antes “varonil” (pátria, fé e família) revelou sua face porca; ser em grande maioria covil de larápios, quem sabe o paneleiro possa desexplicar seu voto, descobrir sua visão de mundo e se depare com a lucidez ou com ódio (in)consciente...

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

Onde:
https://jornalggn.com.br/noticia/perfil-transverso-de-um-delegado-federal-em-notas-insolitas-por-armando-coelho-neto


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