segunda-feira, 16 de março de 2015

Separar alhos de bugalhos: contra a corrupção, Reforma Política!

Obra de Ursus Wehrli com fotos de Geri Born e Daniel Spehr


É ótimo que a sociedade brasileira se posicione contra a corrupção, pois ela é i-n-a-c-e-i-t-á-v-e-l e drena recursos que são subtraídos das políticas públicas e do bem comum. 

Cidadania implica, também, deveres. Todos nós os temos para com o país e a comunidade. Desde as poderosíssimas Organizações Globo - que não podem inventar artifícios fiscais criativos para sonegar impostos, como foi feito com o dinheiro dos direitos de transmissão da Copa de 2002, enviados para uma empresa de fachada em um paraíso fiscal -, passando por aqueles que compram imóveis sem declarar o valor real para a Receita Federal, cobram consultas com ou sem recibo, até o mais simples cidadão que tem seus impostos descontados em folha.

I-n-a-c-e-i-t-á-v-e-l, também, é a manipulação seletiva e ideológica do tema corrupção, que tenta produzir um clima apocalíptico, histérico, irracional, encharcado de ódio, alimentado por mentiras, demonizações, omissões e desinformações. Nesse delírio manipulatório, tenta-se convencer a sociedade de que a corrupção foi inventada quando os trabalhistas chegaram ao poder. Claro que para isso é necessário omitir e esconder os próprios desvios e os dos amigos e aliados. 

Antes, era tudo limpo e honesto. Não existiram problemas na construção da Transamazônica, de Itaipu, da Ponte Rio-Niterói (e o fato de vivermos em uma ditadura, sob censura e sem liberdade de expressão, de imprensa e de manifestação, era mero detalhe). Nunca houve manipulação de informações sigilosas às vésperas dos planos econômicos e ninguém lucrou com isso. Nunca houve quebras bancárias fraudulentas nem privatizações obscuras e escandalosas de bancos públicos. O "maior processo de privatização do planeta",  pelo qual passaram as empresas públicas brasileiras, foi transparente e franco, como o sorriso banguela de um neném. Os recursos das superintendências regionais, criadas para estimular o desenvolvimento e corrigir desequilíbrios estruturais, nunca foram apropriados por caciques políticos e latifundiários e a "indústria da seca" não passou de uma quimera. Nunca houve uma política criminosa de depreciar e tentar desmembrar  a Petrobrás com vistas a vendê-la a preço de bananas. Jamais existiu a compra de congressistas para aprovar a emenda constitucional que instituiu a reeleição. A lista continua, é volumosa e abarca todos os três Poderes da República, barões da mídia, multinacionais, empresários, grandes proprietários de terras, juízes, políticos, empreiteiros, agentes públicos etc.

No presente, é mesmo modus operandi que esconde o Trensalão tucano e as contas do Rodanel; silencia sobre a construção do aeroporto do tio do Aécio com dinheiro público; mantém o mistério sobre a propriedade do jatinho que matou Eduardo Campos; ignora a responsabilidade da Sabesp na crise hídrica de São Paulo; evita o mensalão do DEM em Brasília e RN; guarda um segredo sepulcral em relação aos 450 kg de cocaína apreendidos no helicóptero dos Perrela; "esquece" os esquemas criminosos  envolvendo a Revista Veja, o Carlinhos Cachoeira e o impoluto Demóstenes Torres; alimenta os vazamentos seletivos da Polícia Federal, do Ministério Público, do Judiciário e atiça a militância escancarada de seus membros (que deveriam mostrar isenção e neutralidade no desempenho do ofício). Etc, etc, etc.

I-n-a-c-e-i-t-á-v-e-l, ainda, é usar o combate à corrupção, que é legítimo, urgente e necessário,  para atacar a democracia, exigir impeachment da presidenta - sem base jurídica nenhuma, apenas o inconformismo com o resultado das eleições -, e pregar o golpe militar. Em relação a este último, a Constituição Federal não deixa dúvidas:

Art. 5, XLIV: "constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático".

Golpismo é crime. Defender publicamente golpe militar não é exercer a liberdade de expressão, é fazer apologia de um crime inafiançável e imprescritível! E foi isso que muitos manifestantes fizeram nos protestos de ontem (e, pelo visto, não sabem sequer a diferença entre intervenção federal e golpe militar, ao clamar por uma exdrúxula "intervenção militar"):

http://jornalggn.com.br/noticia/imagens-constrangedoras-das-manifestacoes-de-domingo

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/com-todo-o-respeito-foi-muito-mais-uma-palhacada-que-um-protesto/

http://www.diariodocentrodomundo.com.br/isso-aqui-e-uma-putaria-e-disso-eu-entendo-o-dono-do-bahamas-e-outras-figuras-na-paulista/

Voltando ao que interessa: o combate à corrupção. Quem é realmente contra a corrupção, quer atacar suas causas e não apenas os sintomas. Como diz Marcelo Zero,

... "Ao contrário do que o ubíquo neoudenismo concebe, a corrupção não se combate com indignação serôdia e moralismo seletivo e politicamente motivado.

O verdadeiro e consistente combate à corrupção se dá fundamentalmente mediante o fortalecimento dos órgãos independentes de controle e pela promoção da transparência na administração pública. Com isso, enfrentam-se as causas mais imediatas e diretas da corrupção.

Pois bem, nenhum governo investiu mais nessa política consistente de combate aos desvios que os governos do PT.

Os dados a esse respeito são inequívocos.

As operações especiais da polícia federal passaram de ao redor de 6 ao ano, nos governos do PSDB, para cerca de 250 ao ano, nos governos do PT. Nas duas gestões de FHC, tais operações somaram somente 48. Nas gestões Lula e Dilma, tais operações especiais já ascendem a 2.226.

A Controladoria Geral da República, motivo de chacota pública no governo anterior ao de Lula, tornou-se uma eficiente instituição que fiscaliza com rigor as verbas federais destinadas aos municípios.

As procuradorias e o Ministério Público foram igualmente fortalecidos e, hoje, desempenham suas funções com independência e desenvoltura. Extinguiu-se a triste figura do "engavetador-geral", com a escolha de procuradores independentes, indicados pelo corpo técnico das instituições. O mesmo aconteceu no âmbito da Polícia Federal, que passou a ser dirigida por delegados sem vínculo político com o governo, como aconteceu nos tempos do PSDB.

O notável fortalecimento do Judiciário, ocorrido em período recente, também contribuiu para que os ilícitos fossem apurados com maior rigor e celeridade.

Ao mesmo tempo, com a criação do Portal da Transparência, a Lei de Acesso à Informação e outras medidas semelhantes, a administração pública federal tornou-se muito mais receptiva ao "detergente da luz do sol", para usar a expressão famosa do juiz Louis Brandeis.

Mas não é só isso.

O governo do PT também vem contribuindo para o combate à corrupção ao atacar causas indiretas, mas profundas, do fenômeno.

Em países como o nosso, a corrupção tem forte correlação com a privatização do Estado, a cidadania de baixa densidade e os altos índices de desigualdade pobreza.

O Estado brasileiro foi frequentemente capturado por interesses privados e, como tal, não operava para o bem comum e o grosso da população, historicamente excluída de direitos e das políticas estatais. Saliente-se que esse caráter excludente e patrimonialista do Estado foi, em alguns casos, exacerbado pelas políticas neoliberais, que consolidaram uma espécie de neopatrimonialismo e tentaram desconstruir os núcleos republicanos do aparelho estatal.

Além disso, o caráter relativamente recente do processo de construção da nossa democracia tende a tornar o aparelho estatal relativamente infenso ao controle social. Isso era agravado por uma "cidadania de baixa densidade", ocasionada pelos históricos processos de exclusão econômica, social e política, e por índices muito altos de desigualdade e pobreza."

Pois bem, os governos de Lula e Dilma iniciaram um processo de "desprivatização" do Estado, direcionando fortemente as políticas públicas para o combate à exclusão econômica e social da maioria da população. Concomitantemente, geraram também um processo lento, mas seguro, de construção e fortalecimento de cidadania, que tende a colocar o aparelho estatal sob a égide e controle de um verdadeiro interesse público, e não mais sob o tacão de alguns interesses privados dos grupos secularmente dominantes.

O fundamental, contudo, é que governos Lula e Dilma iniciaram uma verdadeira revolução social no Brasil, retirando cerca de 36 milhões de pessoas da pobreza extrema e propiciando a ascensão à classe média a cerca de 42 milhões de cidadãos brasileiros."

..."Toda essa política sólida de ataque às causas diretas e indiretas da corrupção e dos desvios fez aumentar, é óbvio, as denúncias e as investigações sobre o tema.

A mídia neoudenista e conservadora apresenta tal fenômeno como algo negativo, um sintoma de um suposto aumento da corrupção no país. Não é verdade.

Na realidade, trata-se de um fenômeno muito positivo para a nossa democracia. O que realmente aumentou, de forma exponencial, foi a capacidade das instituições de controle e da própria cidadania de controlar o Estado e de combater os desvios.

O Brasil não vive, como se diz vulgarmente, uma "crise de corrupção". O Brasil vive o processo doloroso, mas necessário, do fim da sua histórica impunidade.



Não é o "mar de lama", do qual gostam tanto de falar os neoudenistas. É um rio que está passando pela vida do país, limpando-o.



Porém, a luta efetiva contra a corrupção, mal histórico do Brasil, está apenas começando. É necessário avançar muito mais. É preciso, sobretudo, transformar a revolução social ocorrida nos últimos 12 anos no Brasil numa revolução política.


Assim sendo, o próximo e essencial passo é a Reforma Política. Com efeito, tal reforma é fundamental para limitar a influência avassaladora do poder econômico sobre o sistema de representação e o aparelho do Estado. Ela é essencial para colocar as instituições e políticas públicas a serviço do cidadão comum e dos setores populares e, dessa forma, desatar, em definitivo, as amarras políticas ao nosso desenvolvimento ditadas pelo patrimonialismo, o presidencialismo de coalizão, a sobrerrepresentação de interesses dos grandes grupos econômicos e tantas outras mazelas do Estado brasileiro.

Portanto, quem leva o combate à corrupção a sério não se deixa enganar pelo neoudenismo e seu moralismo seletivo e politicamente motivado. Ele não dá respostas racionais à questão, apenas vocifera contra a corrupção que já está sendo combatida.

Por trás dele, estão forças francamente reacionárias que não estão realmente interessadas em combater desvios, mas apenas em desestabilizar um governo legítimo e em rever as próprias políticas que vêm possibilitando a luta consistente contra as causas da corrupção.

Quem é verdadeiramente contra a corrupção e os desvios não quer golpe contra o governo que vem atacando esse mal em sua origem.

Quem é realmente contra corrupção quer a Reforma Política, o aprofundamento das políticas que vêm revolucionando socialmente o Brasil e, sobretudo, o respeito ao mandato legítimo de uma presidenta séria e honesta."



Onde:

The art of clean up # Ursus Wehrli
Chronicle Books

http://www.brasil247.com/pt/247/artigos/173292/Quem-%C3%A9-Contra-a-Corrup%C3%A7%C3%A3o-n%C3%A3o-quer-Golpe-quer-Reforma-Pol%C3%ADtica.htm

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