Deu 11hs na minha janela.
sexta-feira, 26 de junho de 2020
sábado, 4 de abril de 2020
Vírus chinês?

Xenofobia e mentiras da imprensa não podem ocultar o papel central do país na linha de frente do combate ao coronavírus.
POR DU XIAOJUN, VIJAY PRASHAD E WEIYAN ZHU
No dia 25 de março, os chanceleres dos países que integram o G7 não conseguiram emitir uma declaração sobre a pandemia da covid-19. Os EUA – que naquele momento presidiam o organismo – apresentou uma proposta que foi considerada inaceitável por diversos membros.
O texto redatado utilizava a expressão “vírus de Wuhan” e afirmava que a pandemia mundial era responsabilidade do governo chinês. Anteriormente, o presidente estadunidense, Donald Trump, tinha utilizado a expressão “vírus chinês” (que disse que deixaria de utilizar) e um dos membros da sua equipe tinha dito a calúnia “kung flu” [gripe kung]. Na Fox News, o apresentador Jesse Walters afirmou, com seu estilo racista sem filtro, que o vírus começou na China “porque lá tem esses mercados onde comem morcegos e serpentes crus”. Os ataques violentos contra asiáticos dispararam, como consequência do estigma impulsionado pelo governo de Trump.
Muito antes de que o vírus chegasse à Europa e América do Norte, o diretor geral da Organização Mundial da Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, tinha feito um chamado “à solidariedade e não ao estigma”, em um pronunciamento do dia 14 de fevereiro. Ghebreyesus se adiantou à tendência (tentação) de utilizar o vírus como uma arma para atacar a China. Seu slogan tinha a intenção de demarcar claramente uma resposta humanista e internacionalista à pandemia mundial frente a uma resposta intolerante e não científica.
Origens
O SARS-CoV-2, nome oficial do vírus, se desenvolveu da mesma forma que muitos outros: por transmissão de animais a humanos. Ainda não existe um consenso sobre onde e como isso aconteceu. Uma das sugestões é que teria se originado no Mercado Atacadista de Frutos do mar de Huanan, na província chinesa de Hubei, onde são vendidos animais silvestres. Ainda que o ponto crucial a ser levado em conta seja a expansão da agricultura em bosques e terras interiores, onde os seres humanos têm mais probabilidade de interagir com novos patógenos como o SARS-CoV-2.
Mas este não é o único vírus deste tipo, ainda que, sem dúvida, seja o mais perigoso para os seres humanos. Recentemente, vimos uma gama de gripe aviária que ataca muitas espécies de animais, denominadas de forma técnica como H1N1, H5Nx, H5N2 e H5N6. Ainda que o vírus H5N2 tenha se originado nos EUA, não é conhecido como “vírus estadunidense” e ninguém estigmatizou o país por isso.
A denominação de um vírus é um assunto controverso. Em 1832, a cólera avançava da Índia britânica à Europa. Foi chamado de “cólera asiática”. Nesse contexto, os franceses assumiram que, por seu caráter democrático, não sucumbiriam a uma doença emanada de uma ordem autoritária. Assim, a França foi assolada pela cólera, o que não tinha a ver tanto com a bactéria quanto com o estado da higiene na Europa e na América do Norte.
A “gripe espanhola” só foi nomeada assim, pela Espanha, porque chegou durante a Primeira Guerra Mundial. Como não estava em guerra, os meios de comunicação do país informaram amplamente sobre a gripe e assim a pandemia ganhou este nome. Mas as evidências mostram que o vírus foi originado nos EUA, em uma base militar em Kansas, na qual os frangos transmitiram o vírus aos soldados, que viajaram em seguida à Índia britânica, onde aconteceram 60% das mortes pela pandemia.
Nunca foi chamada de “gripe estadunidense” e nenhum governo indiano exigiu um ressarcimento dos EUA porque a transmissão dos animais a humanos tenha ocorrido ali.
A China e o coronavírus
Em um importante artigo publicado na revista médica The Lancet, o professor Chaolin Huang escreveu: “A data de início dos sintomas do primeiro paciente [de SARS-CoV-2] identificado foi 1 de dezembro de 2019”. Inicialmente, houve muita confusão sobre a natureza do vírus e se podia ser transmitido entre seres humanos. Considerou-se que era um vírus conhecido, transmitido principalmente de animais a humanos.
A doutora Zhang Jixian, diretora do Departamento de Medicina Respiratória e Cuidados Críticos do Hospital de Medicina Integrada de Medicina Chinesa e Ocidental da província de Hubei foi uma das primeiras profissionais a alertar sobre o novo surto de pneumonia por coronavírus. No dia 26 de dezembro, ela atendeu um casal de idosos que apresentavam febre alta e tosse. Os exames adicionais descartaram influenza A e B, micoplasmas, clamídia, adenovírus e SARS. Uma tomografia do filho do casal mostrou que algo também tinha enchido parcialmente seus pulmões.
Nesse mesmo dia, outro paciente, um vendedor do mercado de frutos do mar, apresentou os mesmos sintomas. A doutora Zhang reportou os quatro casos ao Centro de Prevenção e Controle de Doenças da China em Wuhan. Nos dias posteriores, ela e sua equipe atenderam outros três pacientes que tinham visitado o mercado de frutos do mar e tinham os mesmos sintomas.
No dia 29 de dezembro, o Centro de Prevenção e Controle de Doenças de Hubei enviou especialistas para investigar os sete pacientes do hospital. No dia 6 de fevereiro, a província de Hubei reconheceu o valioso trabalho de Zhang e sua equipe na luta pela identificação do vírus. Não houve nenhuma tentativa de ocultar seu trabalho.
Outros dois médicos do Hospital Central de Wuhan, o doutor Li Wenliang e a doutora Ai Fen tiveram um papel importante em prestar esclarecimentos sobre o novo vírus. Nos primeros dias, foram reprendidos pelas autoridades que consideraram que eles tinham divulgado informações falsas. Li morreu de coronavírus no dia 7 de fevereiro. No dia 19 de marzo, o Escritório de Segurança Pública de Wuhan admitiu ter repreendido o médico de forma inapropriada e puniu seus funcionários. O mesmo aconteceu com Ai Fen, que em fevereiro recebeu um pedido oficial de desculpa e foi parabenizada pela Estação de Rádio e Televisão de Wuhan.
As autoridades locais tiveram conhecimento sobre o novo vírus no dia 29 de dezembro. No dia seguinte, informou o Centro de Controle de Doenças da China e dois dias depois, a China informou a OMS. O vírus foi identificado no dia 3 de janeiro; uma semana depois, o governo chinês compartilhou a sequência genética do novo coronavírus com a OMS. Foi graças ao trabalho do país em compartilhar o DNA do vírus que outros trabalhos puderam ser iniciados em todo o mundo para encontrar uma vacina. Atualmente, existem mais de 40 processos, quatro em etapa de testes iniciais.
A Comissão Nacional da Saúde na China criou um grupo de especialistas de diversos organismos que realizaram uma série de experimentos com as amostras do vírus. Dia 8 de janeiro, eles confirmaram que o novo coronavírus era realmente a fonte do surto. A primeira morte por coronavírus foi reportada o dia 11 de janeiro. No dia 14 de janeiro, a Comissão Municipal de Saúde de Wuhan disse que ainda não havia evidências de transmissão de pessoa a pessoa, mas que não podiam afirmam com certeza que isso não era possível.
Uma semana depois, no dia 20 de janeiro, o doutor Zhong Nanshan (especialista em doenças respiratórias e referência na luta contra a SARS), disse que o novo coronavírus podia ser transmitido de pessoa a pessoa. Parte da equipe médica tinha sido infectada com o vírus. Nesse dia, o presidente chinês, Xi Jinping, e o primeiro-ministro, Li Keqiang, deram instruções à Comissão Nacional de Saúde e outros organismos oficiais que começaram a aplicar as medidas de emergência. Wuhan entrou em confinamento total no dia 23 de janeiro, três dias depois da confirmação de transmissão humana do vírus. No dia seguinte, a província de Hubei ativou um alerta nível 1. No dia 27 de janeiro, o primeiro-ministro visitou Wuhan.
Milhares de médicos e equipes médicas chegaram à Wuhan, foram construídos dos novos hospitais para os infectados e diversos organismos civis entraram em ação para prestar assistência às famílias isoladas. O que as autoridades chinesas fizeram para barrar o aumento dos contágios foi colocar todos os infectados nos hospital e também aqueles que tinham tido contato com eles. Esta política seletiva conseguiu identificar aqueles que faziam parte da cadeia de transmissão e interrompê-la.
Uma equipe da OMS que visitou a China entre 16 e 24 de fevereiro, elogiou em seu relatório o povo e o governo chinês por terem feito o possível para deter a propagação do vírus.
O mundo e a China
Os EUA foram informados sobre a gravidade do problema imediatamente. No ano novo chinês, os funcionários do Centro de Controle de Doenças da China fizeram uma ligação para Robert Redfield, diretor do Centro de Prevenção e Controle de Doenças dos Estados Unidos, enquanto ele estava de férias. “O ele que escutou, o fez tremer”, escreveu o New York Times.
Dias depois, Redfield conversou com o doutor George F. Gao, chefe do Centro de Controle de Doenças chinês e este “caiu em prantos” durante a conversa. Esta advertência não foi levada a sério.
Um mês depois, em 30 de janeiro, Donald Trump assumiu uma postura muito arrogante. “Acreditamos que haverá um final feliz para nós”, disse, e acrescentou: “Isso eu posso assegurar”. Não decretou emergência nacional até dia 13 de março, quando o vírus já tinha começado a se propagar nos Estados Unidos.
Outros funcionários ao redor do mundo tomaram medidas semelhantes às dos políticos franceses de 1832, que acreditavam que a França não podia ser afetada pela “cólera asiática”. Em 1832, não existia nenhuma cólera asiática, só existia a cólera, que podia prejudicar as pessoas que viviam em más condições higiênicas. Tampouco existe um “vírus chinês”, apenas o SARS-CoV-2.
O povo da China nos mostrou o caminho para enfrentar este vírus, ainda que isso tenha acontecido depois de ensaios e erros. É hora de aprender esta lição. Como disse a OMS “teste, teste e teste” e depois fechamentos, isolamentos e quarentenas. Os médicos chineses que se tornaram especialistas na luta contra o vírus estão agora no Irã, na Itália e e em outros lugares, carregando o espírito do internacionalismo e a colaboração.
Em 4 de março, o New York Times entrevistou o doutor Bruce Aylward, que comandou a equipe da OMS que visitou a China. Quando questionado sobre a resposta do país diante do vírus, disse: “Estão mobilizados como se fosse uma guerra e é o medo do vírus o que os impulsiona. Realmente se viram na primeira fileira de proteção do resto do país e do mundo”.
*Vijay Prashad é historiador, jornalista e diretor do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social; Du Xiaojun é pesquisador na área de Relações Internacionais, Comunicação intercultural e Linguística aplicada (Xangai)e Weiyan Zhu é advogada (Beijing).
**Este artigo é uma tradução do Independent Media Institute e o primeiro de uma série de três artigos que serão publicados nos próximos dias.
Onde:
domingo, 22 de março de 2020
Viu o que você fez?
Médicos cubanos chegam à Itália sob aplausos para ajudar no combate ao Covid-19
Expulsos do Brasil, médicos cubanos são celebrados na Itália
Por Dilma Roussef
O desembarque de uma brigada de médicos cubanos neste domingo na região da Lombardia, na Itália, é uma forte ação de cooperação e solidariedade entre nações. A Itália, embora sendo um dos países mais ricos do mundo é, neste momento, o que mais tem perdido vidas para o COVID-19. Os italianos celebraram o apoio humanitário cubano com aplausos.
A brigada de médicos que chegou à Itália dá continuidade à ajuda sanitária que, de forma sistemática, tem sido realizada por Cuba na Nicarágua, Jamaica, Suriname, Venezuela e Granada. Tais brigadas reafirmam que o caminho para uma vitória sobre a pandemia passa necessariamente pela cooperação e solidariedade entre as Nações.
O povo e o governo de Cuba são um exemplo aos governantes que se rendem a atitudes mesquinhas e mentiras, desdenham da gravidade da crise com um comportamento irresponsavelmente agressivo e diversionista, e não descem do palanque sequer quando o mundo vive a sua maior tragédia em décadas.
Bolsonaro, na sua ignorância irresponsável, já tratou os médicos cubanos com a mesma visão míope e o mesmo preconceito ideológico que dedicou, semana passada, aos chineses, e que o levou a chamar o coronavirus de “gripezinha”.
Em 55 anos, Cuba cumpriu 600 mil missões internacionalistas, em 164 países, envolvendo 400 mil profissionais de saúde. Entre outras ações, lutou contra o ébola na África Ocidental, tratou a cegueira na América Latina e no Caribe, enfrentou a cólera no Haiti e enviou 26 brigadas de resgate e salvação para países como Paquistão, Indonésia, México, Equador, Peru, Chile e Venezuela, diante de grandes desastres e epidemias. A maioria destas missões foi patrocinada pelo governo cubano, que também ofereceu cursos para 35.613 médicos oriundos de 138 países.
Estas ações internacionais correspondem à vocação humanista e solidária do povo cubano, razão pela qual seus médicos são reconhecidos internacionalmente, ao prestar serviço em cerca de 70 países.
No Brasil, os médicos cubanos foram centrais para que o programa Mais Médicos se efetivasse, fortalecendo o SUS e suprindo a falta de profissionais brasileiros no atendimento à população pobre e mais vulnerável. Com mais de 18.000 médicos, o programa Mais Médicos atendeu 63 milhões de brasileiros. Uma parte significativa deste trabalho foi feita pelos mais de 11.000 médicos cubanos que foram o núcleo duro do programa.
O Mais Médicos fez dezenas de milhões de atendimentos, em mais de 4.058 municípios, sobretudo nas regiões metropolitanas, em favelas, nas áreas de periferia, cidades do interior, áreas quilombolas e reservas indígenas. Os cubanos nos ajudaram a tornar possível, pela primeira vez na história, ter um médico em 700 municípios, que jamais haviam tido um único profissional desta área.
No Brasil, a presença dos médicos cubanos seria agora ainda mais estratégica, diante da necessidade de combater o coronavirus e fortalecer a atenção básica de saúde. No entanto, essa parceria em saúde pública, tão fundamental para o País, não sobreviveu à ascensão do governo de extrema-direita de Bolsonaro, que esteve sempre mais preocupado em espalhar mentiras contra “inimigos ideológicos” inexistentes em vez de se dedicar ao cuidado com a saúde da população.
Desrespeitados por Bolsonaro e hostilizados de forma tão infame por seus seguidores fanatizados, os médicos cubanos foram, entretanto, amados pelos pacientes.
Bolsonaro os insultou tanto que o governo de Cuba sentiu-se no dever de chamá-los de volta e encerrar a participação no programa. A chancelaria de Cuba reagiu: “Não é aceitável questionar a dignidade, o profissionalismo e o altruísmo dos nossos médicos”.
E assim, por meio da ofensa e da calúnia, Bolsonaro expulsou do Brasil milhares de profissionais de saúde que seriam de extrema importância neste momento em que o coronavírus começa a se espalhar pelo nosso território. Submete dezenas de milhões de brasileiros ao desamparo e à absoluta impossibilidade de consultar um médico num momento de grave crise e de muito medo e desorientação. Os mesmos médicos que, neste domingo, são recebidos calorosamente pelo governo e pelo povo da Itália. Os mesmos médicos que países do mundo inteiro reconhecem como qualificados e competentes. O mínimo que se poderia dizer, agora, ao presidente despreparado e tosco que finge que governa o Brasil é: “Viu o que você fez?”
Onde:
http://dilma.com.br/expulsos-do-brasil-medicos-cubanos-sao-celebrados-na-italia/
Onde:
http://dilma.com.br/expulsos-do-brasil-medicos-cubanos-sao-celebrados-na-italia/
segunda-feira, 9 de março de 2020
De que são feitos os Direitos
“Sabem do que são feitos os direitos, meus jovens?
Sentem o seu cheiro?
Os direitos são feitos de suor, de sangue, de carne humana apodrecida nos campos de batalha, queimada em fogueiras!
Quando abro a Constituição no artigo quinto, além dos signos, dos enunciados vertidos em linguagem jurídica, sinto cheiro de sangue velho!
Vejo cabeças rolando de guilhotinas, jovens mutilados, mulheres ardendo nas chamas das fogueiras! Ouço o grito enlouquecido dos empalados.
Deparo-me com crianças famintas, enrijecidas por invernos rigorosos, falecidas às portas das fábricas com os estômagos vazios!
Sufoco-me nas chaminés dos Campos de concentração, expelindo cinzas humanas!
Vejo africanos convulsionando nos porões dos navios negreiros.
Ouço o gemido das mulheres indígenas violentadas.
Os direitos são feitos de fluido vital!
Pra se fazer o direito mais elementar, a liberdade, gastou-se séculos e milhares de vidas foram tragadas, foram moídas na máquina de se fazer direitos, a revolução!
Tu achavas que os direitos foram feitos pelos janotas que têm assento nos parlamentos e tribunais?
Engana-te! O direito é feito com a carne do povo!
Quando se revoga um direito, desperdiça-se milhares de vidas …
Os governantes que usurpam direitos, como abutres, alimentam-se dos restos mortais de todos aqueles que morreram para se converterem em direitos!
Quando se concretiza um direito, meus jovens, eterniza-se essas milhares vidas!
Quando concretizamos direitos, damos um sentido à tragédia humana e à nossa própria existência!
O direito e a arte são as únicas evidências de que a odisseia terrena teve algum significado!”
Onde:
https://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-recado-de-uma-juiza-federal-aos-pobres-de-direita/
domingo, 9 de fevereiro de 2020
sábado, 2 de novembro de 2019
Decoro ou falta de
A Dra. Carmem, afinal, livrou-se de ser chamada de promitora
A Doutora Carmem Eliza Bastos de Carvalho, promotora do caso Marielle Franco-Anderson Gomes, não resistiu à exposição de suas fotos na internet com propaganda de Jair Bolsonaro e na sorridente pose com o deputado Rodrigo Amorim, que ficou notório por sua foto vilipendiando a memória da vereadra ao quebrar a placa com o seu nome.
A doutora fez um bem à apuração ao caso, ao Ministério Público e a si mesma.
Tinha virado chacota e já li, num dos comentários de notícias, alguém chamá-la de promitora.
Aprendeu à força algo que se deveria saber de alma: decoro.
A função pública obriga a muito mais que os negócios privados. Não basta ser “legal” e permitido, é preciso ser ético.
Por exemplo: um promotor que persegue a corrupção em um empresa não pode tirar um pouco (se é que R$ 2 bi são pouco) dela para serem colocados numa fundação que ele próprio vai gerir.
Um juiz que condena e impede de que concorra o candidato favorito à Presidência não pode ser ministro do candidato que vence por WO e dele receber um ministério e a promessa de uma cadeira no Supremo.
O impedimento, no processo judicial, é uma figura assentada essencialmente no caráter do juiz e do promotor, mas cai em desuso quando estes perdem a noção de que isso não é uma opção pessoal sem consequências, mas a própria garantia de que o processo legal seja o devido e o crível.
Resta aos promotores remanescentes, diante das dúvidas públicas que já levaram o caso Marielle a ser chamado pela ex-procuradora geral da República a ser algo deformado e corrompido, não usarem o segredo de justiça como instrumentos de lambança.
Periciem não cópias de arquivos, mas os equipamentos do condomínio onde se registravam as ligações. Tomem a providência básica de requerer da Gol – já dei o código dos bilhetes aqui – qual o horário de volta ao Rio de Jair Bolsonaro – protejam o porteiro que é testemunha e não acusado.
Não tratem a investigação como aqueles letreiros de novelas que, retratando fatos reais, colocam um cartaz ao final dizendo que “qualquer semelhança é mera coincidência”.
Onde:
http://www.tijolaco.net/blog/a-dra-carmem-afinal-livrou-se-de-ser-chamada-de-promitora/
quinta-feira, 17 de outubro de 2019
STF: Guardião ou coveiro da Constituição?
Jurista Aury Lopes Jr.
Às vésperas do julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) de três ações que debatem a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, o Brasil de Fato conversou com o jurista Aury Lopes Jr., um dos mais reconhecidos teóricos do Direito Processual Penal no Brasil, sobre o tema.
Rafael Tatemoto
Brasil de Fato | Brasília (DF)
,
O professor da Pontifícia Universidade Católica (PUC-RS), cuja obra serve de referência inclusive para citações dos ministros do STF, desmontou os principais argumentos – classificados por ele como "falaciosos" – dos defensores da ideia.
Segundo ele, não são verdadeiras as justificativas que colocam a Constituição brasileira como uma exceção no campo do direito internacional ao estabelecer que ninguém poderá ser culpado antes do chamado trânsito em julgado – o fim de todos os recursos possíveis em um processo.
O jurista também rechaçou o argumento de que a prisão somente após o fim de todos os recursos favorece a impunidade, por conta da demora do sistema judiciário.
"A questão é que agora temos alguém preso e que amanhã pode ser absolvido, ou a pena pode ser reduzida, podem modificar regime, podem anular o processo inteiro e a pessoa ficou presa anos sem trânsito em julgado, sem fundamento cautelar", explicou agregando que a Constituição prevê o mecanismo de prisão cautelar, que permite o encarceramento antes do trânsito em julgado para casos de necessidade.
Em sua opinião, a posição adotada pela maioria do Supremo em 2016, a favor da prisão em segunda instância, foi "absolutamente equivocada". “Estão subvertendo totalmente [o Estado de Direito]”, avalia Lopes Jr. em relação à defesa feita por parcelas da imprensa e do sistema de Justiça.
Confira abaixo a entrevista completa.
Bdf: Professor, a prisão após trânsito em julgado, ou seja, após o fim de todos os recursos cabíveis, não deveria ser considerada um dispositivo que não pode ser modificado?
Aury Lopes Jr.: A rigor, sim. Está inserido no artigo 5º [da Constituição], que são direitos e garantias fundamentais, que é considerado uma cláusula pétrea.
Nesse sentido, como você vê a decisão tomada pelo Supremo em 2016?
A interpretação que o Supremo deu foi absolutamente equivocada. Errada. Nossa Constituição é muito clara quando fala que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado. Quando o Brasil foi descoberto, em 1500, o mundo do direito processual penal já sabia o que era trânsito em julgado.
É um conceito processual que tem uma historicidade e não é o Supremo que vai ressignificar o que é trânsito julgado a ponto de dizer que existe trânsito em julgado mesmo na pendência de recurso.
Conforme a gente analisa os votos vencedores, existe uma série de falácias e equívocos graves. Por exemplo: "Ninguém pode ser preso antes do trânsito em julgado". Errado. As pessoas podem ser presas a qualquer momento – na investigação, no processo ou em grau recursal. Para isso existe prisão preventiva.
A questão do trânsito em julgado não favorece a impunidade? Esse é um argumento recorrente.
“Temos que prender em segundo grau porque os processos demoram demais no STJ e no STF e isso gera impunidade”. Errado. O problema é que não foram no foco da questão. Se o problema é a demora, tinham que ter resolvido a demora. Os processos continuarão demorando em recurso especial e extraordinário três, quatro anos para serem julgados. A questão é que agora temos alguém preso e que amanhã pode ser absolvido, ou a pena pode ser reduzida, podem modificar regime, podem anular o processo inteiro e a pessoa ficou presa anos sem trânsito em julgado, sem fundamento cautelar.
Eles tinham que ter resolvido a questão da demora. Os processos tinham que ser julgados mais rapidamente. Não é prisão que vai resolver.
Outro argumento é o de que a prisão após condenação em segunda instância é empregada em diversos países democráticos. Chegam a dizer que nosso sistema jurídico é o único que estabelece o trânsito em julgado como momento da prisão.
É importante chamar a atenção para a questão técnica. Mostrar a falácia de evocar o direito comparado.
Para falar em direito comparado, tem que saber direito e tem que saber comparar. Tem que saber que existem limites metodológicos para comparação. Não interessa o que diz a Constituição dos EUA, da França ou de qualquer país. Interessa o que diz a Constituição da República Federativa do Brasil. E aqui fala em trânsito em julgado.
Ponto dois: não é verdadeiro o argumento de que nossa Constituição é um ponto fora da curva. O artigo 32 da Constituição portuguesa diz exatamente isso. "Todo arguido se presume inocente até o trânsito em julgado de sentença de condenação". A Constituição italiana, no artigo 27.2 diz que " a responsabilidade penal é pessoal, o imputado não é considerado culpado senão depois da sentença condenatória definitiva". Existem outras.
Os defensores da medida alegam que ela não afronta o princípio da presunção de inocência. Os críticos dizem que a Constituição, além do princípio mais geral, trouxe uma regra específica. Esse debate foi mal feito pelo STF?
Existe uma falta critério nesta distinção entre princípio e regra. Nossa Constituição estabelece a possibilidade [de prender antes do fim dos recursos], mas pela via da prisão cautelar. A regra é essa.
Nossa Constituição estabelece um marco. Esse é o marco, o trânsito em julgado. Se você não gosta disso, sabe o que tinha que fazer? Não mudar a Constituição, que é uma discussão em torno de cláusula pétrea, mas então que fosse por uma via que eu não concordo, mas que democraticamente era mais honesta, que era a proposta do ministro Cezar Peluzo. O que ele queria fazer: mudar o sistema recursal. Aí sim, transitava em julgado em segundo grau e recurso especial [ao STJ] e recurso extraordinário [ao STF] virariam recursos de cassação, de uma natureza revisional. Eu não concordo, mas pelo menos seria mais honesto.
Mas via STF ou no Parlamento?
Eu menciono apenas como uma forma mais democrática. A proposta dele era de uma mudança legislativa via Congresso Nacional e debate político. Se no voto nós perdêssemos, é do jogo democrático. O Peluzo não estava propondo que o Supremo fizesse isso. O que ocorreu foi o Supremo rasgar a Constituição a golpes de martelo.
Os contrários à revisão do posicionamento do Supremo fazem um certo alarde sobre a possibilidade de milhares de pessoas serem soltas. Esse tipo de fala não inverte a lógica do Estado de Direito?
Essa decisão gerou um impacto carcerário, num sistema como o nosso, medieval e absurdamente caótico, um problema gigantesco. Estão subvertendo totalmente. Nós temos hoje no Brasil uma multidão não conhecida de aproximadamente 850 mil presos. Nem o Estado sabe exatamente. Nessa massa, existe aproximadamente 25% de presos em decorrência de execução antecipada. E mais uma parcela aproximada de 45% de presos preventivos. Se somar, nós temos um número absurdo de 70% da população carcerária presa sem trânsito em julgado. Isso é absurdo.
Os contrários à revisão do posicionamento do Supremo fazem um certo alarde sobre a possibilidade de milhares de pessoas serem soltas. Esse tipo de fala não inverte a lógica do Estado de Direito?
Essa decisão gerou um impacto carcerário, num sistema como o nosso, medieval e absurdamente caótico, um problema gigantesco. Estão subvertendo totalmente. Nós temos hoje no Brasil uma multidão não conhecida de aproximadamente 850 mil presos. Nem o Estado sabe exatamente. Nessa massa, existe aproximadamente 25% de presos em decorrência de execução antecipada. E mais uma parcela aproximada de 45% de presos preventivos. Se somar, nós temos um número absurdo de 70% da população carcerária presa sem trânsito em julgado. Isso é absurdo.
“Se o Supremo mudar o entendimento vamos soltar milhares de pessoas”. Sim. Milhares de pessoas que não deveriam estar presas. Se nós tivermos pessoas perigosas nesse conjunto, em que a prisão é necessária, decretem a prisão preventiva que sempre pode e sempre poderá. O que não pode é prisão automática, irracional, sem motivo, violando a Constituição.
Pode prender, preventiva está aí para isso.
Mais um argumento: há alegações de que não há problema em prender após a segunda instância pois a taxa de reversão de decisões no STJ e STF é baixa.
O ministro Barroso alardeou sempre que o índice de reversibilidade no STJ é mínimo. Disse que não chegava a 1% de decisões modificadas. Errado. Tem uma falha metodológica gravíssima. Se você colocar como termo de busca "recurso especial; absolvição", você vai ter 1% de casos. Mas isso está errado. Se colocar, ao invés de somente esse termo, "absolvição; redução de pena; mudança de regime; extinção da punibilidade; prova ilícita; anulação de processos" e colocar "agravo em recurso especial; agravo regimental" e, principalmente, "habeas corpus substitutivo de recurso especial" esse índice pula para um número absurdamente elevado.
A Defensoria Pública de São Paulo, do Rio de Janeiro, IBCCRIM, FGV fizeram uma pesquisa apontando que o índice de mudança chega a 46%. É extramente relevante. Fizeram discursos bastante reducionistas sobre o tema.
Entre a regra expressa da Constituição e a prisão automática após segunda instância há debates sobre posições intermediárias…
A proposta do ministro Toffoli – "vamos admitir a execução após o julgamento do STJ" – pode ser uma solução politicamente razoável. Mas processualmente é tão errada quanto a situação que temos hoje. O marco é trânsito em julgado. Ponto. Se houver um recurso extraordinário admitido, não é trânsito em julgado. A proposta incide no mesmo erro.
E a ideia de prisão após segunda instância não automática, com necessidade de fundamentação em cada caso concreto?
Isso é uma falácia. Fundamentado no que? Na necessidade? É [caso de] prisão preventiva. Vamos para a prisão preventiva.
Não existe meio termo. Isso é uma solução errada. O julgamento é sobre três ações declaratórias de constitucionalidade do artigo 283. Se o Supremo disser que o 283 é constitucional, ele vai condicionar a exatamente isso que eu falei.
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